Você já deve estar cansado de saber que nossa sociedade impõe padrões de beleza irreais e que devemos amar nosso próprio corpo para sermos felizes. Assim como você, milhares de mulheres e homens com transtornos de imagem e alimentares pensam a mesma coisa. Parece ilógico, não? É justamente essa a ideia usada por um novo método terapêutico para evitar e tratar distúrbios como anorexia e bulimia.
Chamado de Programa Baseado na Dissonância dos Transtornos Alimentares, o método aplica a terapia pela dissonância cognitiva, que além de ajudar a romper com os padrões de beleza também pode ajudar na saúde cardíaca.
O que é dissonância cognitiva?

De acordo com a psicóloga clínica e experimental Liane Dahás, que atua no Ambulatório de Transtornos Alimentares do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e é vice-presidente da Associação Brasileira de Psicologia e Medicina Comportamental, a dissonância cognitiva é um fenômeno que presenciamos várias vezes em nosso dia a dia. Ela ocorre quando agimos contra nossos próprios valores.
Muito parecida com a ideia de “falso moralismo”, esse acontecimento pode ser facilmente exemplificado: imagine alguém que ache um absurdo dirigir bêbado, mas, ao sair para jantar, essa pessoa tome bebidas alcoólicas e volte como motorista. Ou seja, ela agiu contrariamente à própria opinião, criando uma contradição.
Dissonância cognitiva para transtornos alimentares: como é feita

Segundo a psicóloga Liane Dahás, 20% das anoréxicas morrem por suicídio ou inanição em decorrência da doença, o que configura o maior índice entre os transtornos psiquiátricos. Outros 50% desenvolvem bulimia, que por sua vez pode causar hospitalizações e doenças graves, como as cardíacas.
Há várias atividades que integram essa terapia. Uma delas consiste em criticar verbalmente e por escrito a ditadura da magreza a todo o custo, o que ressalta a incoerência e ajuda a conscientizar quanto à aceitar seu próprio corpo e cuidar dele.
Todavia, a especialista esclarece que o tratamento da anorexia e bulimia deve ser multidisciplinar, integrando também outros profissionais, como nutricionista, educador físico, psiquiatra e fisioterapeuta.
Além de ajudar quem já sofre do transtorno, o método é válido para prevenção, visto que também atinge pessoas na faixa de risco, ou seja, quem possui grande probabilidade de ter o comer transtornado.
Resultados: sintomas reduzidos e autoestima elevada
A fim de reduzir a incidência dos transtornos e seu desfecho fatal, a professora de psicologia da universidade norte-americana Cornell, Melinda Green, realizou um estudo com 47 mulheres e meninas com sintomas de desordens alimentares.
Nele, ela as encorajou a criticar a ideia de que apenas as pessoas magras são consideradas bonitas. O trabalho ainda fez com que as garotas aprendessem a combater e refutar quaisquer mensagens que relacionem nosso valor com nossa aparência.
Em apenas quatro semanas do programa do Cornell College, foi possível perceber muitas melhoras: os sintomas de distúrbios diminuíram, assim como ansiedade e o negativismo. Já o que cresceu foi a autoestima e satisfação das mulheres com seus corpos, visto que elas aprenderam a não idealizar que beleza é sinônimo de magreza.
Outro estudo, realizado por pesquisadores do Oregon Research Institute, validou ainda mais o método: eles testaram se a terapia dissonante produz efeitos em longo prazo a partir da análise de 306 garotas com idade média de 16 anos e preocupações com a imagem corporal.
Todas as meninas que participaram do programa registraram o aumento da satisfação com sua própria aparência e também a redução dos sintomas de transtorno alimentar.
De acordo com Liane, os estudos que apontam resultados positivos defendem que foi justamente é o momento de dissonância, por explicitar a incoerência entre o que é declarado verbalmente e o que é feito na vida cotidiana, que leva ao surgimento de comportamentos mais saudáveis com relação ao próprio corpo.
Risco cardíaco também diminuiu
A pesquisa do Cornell College também teve o intuito de descobrir a relação entre os transtornos e o risco de problemas cardiovasculares. Para isso, foram analisados os sintomas de distúrbios alimentares, índice de massa corporal e biomarcadores de risco cardíaco antes, logo após e dois meses depois da terapia.
Os resultados confirmaram a teoria de que a incidência desses quadros psiquiátricos anda lado a lado com as doenças do coração. Ou seja: se elas pioram, o risco aumenta, e se elas melhoram, o risco diminui.
Transtornos que afetam a imagem
- Vômitos da bulimia e anorexia podem até quebrar os dentes por desgaste
- O que é ortorexia: quando a preocupação com a alimentação vira obsessão?
- Tudo sobre vigorexia: causas e consequências da síndrome dos marombados