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Proposta quer que grupo de trabalhadores fique sem férias e até sem salário: é real?

Publicado 8 Mai 2017 – 02:00 PM EDT | Atualizado 16 Mar 2018 – 10:10 AM EDT
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*Matéria publicada em 8 de maio de 2017

Trabalhadores rurais também entraram no pacote de mudanças das leis trabalhistas propostas pelo Governo. Desta vez, a Câmara dos Deputados colocará na roda o projeto de lei 6442/2016, que tem sido alvo de críticas daqueles que acreditam que os empregados estão perdendo seus direitos, já que, segundo a proposta, eles poderiam ficar sem férias e sem salário.

 Defendido pela Frente Parlamentar Agropecuária (FPA), o texto foi apresentado pelo presidente do grupo também conhecido como bancada ruralista, o deputado federal Nilton Leitão.

Abaixo, selecionamos as partes mais controversas do texto original e o posicionamento de duas entidades muito importantes no âmbito trabalhista: o Ministério Público do Trabalho (MPT) e, neste caso sobre trabalhadores do campo, a própria FPA. 

O MPT divulgou uma nota técnica assinada pelo procurador-geral do Trabalho Ronaldo Fleury, rejeitando integralmente o texto da reforma, enquanto a FPA publicou perguntas e repostas sobre o projeto em seu site.

A proposta do Governo ainda depende de aprovação final para começar a valer. 

Detalhes do projeto de lei: trabalhador rural

1. Por que essas mudanças são necessárias agora?

A FPA tenta aprovar o projeto de lei separado da reforma trabalhista que já muda mais de 100 pontos da CLT, como o fato de o que for combinado em acordo coletivo ou individual – em alguns pontos – prevalecerá sobre a lei. Para o órgão, é necessário dar uma nova cara às relações de trabalho no campo porque o trabalho rural tem usos e costumes diferentes do meio urbano.

O MPT destaca que esses acordos coletivos, quando aplicados, já possuem força de lei. Isso significaria que a abertura para este tipo de negociação só seria uma brecha para “exclusão de direitos trabalhistas pela via negocial”. O órgão destaca que, na área rural, há um “desequilíbrio” entre a representação dos trabalhadores e dos patrões, pelo fato de ser um ambiente com alta rotatividade nos postos de trabalho e informalidade.

2. Eles poderão ser pagos com comida, moradia ou terra?

A FPA diz que moradia e alimentação estão fora do salário do trabalhador rural, ao contrário do que vem sendo noticiado nas últimas semanas: tudo isso seria “benefício adicional” e a ideia do projeto é que o patrão possa dar esse “agrado” sem que ele integre o salário contratual.

O artigo 16 do projeto estabelece que o patrão só poderá descontar até 20% do salário por moradia e 25% por alimentação. Ou seja, o salário do trabalhador não poderá ser totalmente revertido em comida ou casa.

Já o Ministério Público do Trabalho pondera que o seguinte trecho do projeto: “Empregado rural é toda pessoa física que, em propriedade rural ou prédio rústico, presta serviços de natureza não eventual a empregador rural ou agroindustrial, sob a dependência e subordinação deste e mediante salário ou remuneração de qualquer espécie”, no artigo 3, desobriga, sim, a fixação do pagamento em salário.

3. Quem trabalha no campo pode ficar sem férias?

Sim e, originalmente, o texto só prevê que o empregador resida onde trabalha para que isto ocorra, sem outra condição específica. 

Em nota, entretanto, a Frente Parlamentar diz que “a proposta atenderia aquelas propriedades com funcionário único, que reside na fazenda e possui criações e plantações na mesma propriedade”. Neste caso, o grupo diz que o trabalhador não viaja, porque não tem quem cuide de suas criações e plantações. “Quando o serviço principal, por exemplo, é Pecuária de leite (pequeno porte), é difícil a substituição do funcionário por questões específicas da atividade”. 

O MPT critica este posicionamento, pois entende que esta mudança desconsidera que este descanso anual promove o convívio familiar do trabalhador rural, evita cansaço e até acidentes de trabalho.

4. Se o trabalhador não mora onde trabalha, poderá trabalhar até 18 dias seguidos para ter folga?

Sim, ele poderá deixar de ter repouso semanal para descansar em dias contínuos.

Em defesa, a FPA diz que isto pode “possibilitar melhor convívio familiar e social” para aqueles que moram longe de onde trabalham e, assim, teriam mais tempo para chegar em casa. A Frente destaca que isso é socialmente aceito no meio urbano; “basta ver o caso dos trabalhadores em plataformas petrolíferas e cruzeiros marítimos”. 

O MPT diz que essa possibilidade ignora o direito à saúde física, psíquica e social do trabalhador e viola o texto constitucional, que impõe descanso semanal preferencialmente aos domingos.

5. Como ficam as horas de trabalho no campo com o projeto? 

Antes de ler sobre a opinião de cada entidade, é importante saber o que está em jogo:

a) o tempo de deslocamento até o ponto de trabalho não contará como jornada de trabalho, na ida e na volta (e mais: se o funcionário se acidentar no trajeto e não estiver em veículo da empresa, ela não se responsabilizará por isso). 

b) A jornada não poderá ultrapassar 44 horas semanais e 8 horas de trabalho, com um ‘porém’: o dia de trabalho poderá ser estendido por até quatro horas se houver “necessidade imperiosa ou por motivo de força maior” (por exemplo, chuva, frio ou seca prolongados, geadas e combate a pragas que exijam medida urgente) ou ainda a conclusão de “serviços inadiáveis”.

Sobre o fato da letra (a), a Frente Parlamentar Agropecuária afirma que quando o fazendeiro paga pelo transporte do trabalhador e o tempo de deslocamento é visto como hora trabalhada, o empregador está sendo ‘penalizado’; em comparação, diz ainda que esse pagamento não acontece para os trabalhadores urbanos que moram em grandes cidades e demoram a chegar ao serviço. 

O posicionamento do MPT diz que isto é um “retrocesso histórico”. Para o órgão, o fato de o empregador ter que remunerar estas horas ajuda, justamente, a evitar que os trabalhadores sejam submetidos a longos períodos de deslocamento, já que o patrão precisa arrumar uma logística eficiente para isto.

Sobre a letra (b), a FPA defende que o patamar de 12 horas de trabalho, em condições específicas, já é previsto pela CLT e que o excesso de horas em um dia deve ser compensado pela correspondente diminuição em qualquer outro dia, de maneira que não exceda, no período máximo de um ano.

O Ministério Público do Trabalho avalia que isso prejudica o trabalhador, já submetido a “condições adversas de trabalho”. 

Mais mudanças

O projeto de lei ainda tira da regra sobre manipulação de agrotóxicos o Ministério da Saúde e o do Trabalho (deixando só o Ministério da Agricultura), libera a aplicação deles por maiores de 60 anos (o que hoje é proibido).

Extingue a obrigação de se descontaminar os equipamentos de segurança ao fim de cada jornada e afirma que a empresa só precisará dar infraestrutura, como banheiro, área de descanso e para refeição, se a frente de trabalho tiver mais de 20 pessoas. 

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