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Casos como o de William Waack provam que mídia não pode mais ignorar voz do público

Publicado 9 Nov 2017 – 04:23 PM EST | Atualizado 15 Mar 2018 – 11:36 AM EDT
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Quando a internet passa a ser um componente pesado na comunicação entre pessoas e empresas, a informação começa a circular de forma diferente. E se antes, o consumidor era passivo, as redes sociais passam a dar voz e a forma como veículos e produtores falam com o público – e vice-versa.

E o momento em que esse novo tipo de relação mais se destaca é quando o público fica insatisfeito. A rapidez com que a Rede Globo tomou medidas (ainda que provisórias) em relação à acusação de racismo envolvendo o jornalista William Waack comprova: ainda que de maneira atribulada, o público espera e exige uma reposta, qualquer que seja.

“Existe um caminho de duas mãos na comunicação, em que os leitores e espectadores interagem de forma muito rápida com as empresas. A mídia tradicional não tem controle sobre o que o público está falando sobre ela, então a cobrança vem muito rápido e surge uma certa obrigação em dar respostas”, explica o Coordenador do Centro Experimental de Jornalismo da ESPM e mestrando em Produção Jornalística e Mercado, Antonio da Rocha Filho, em entrevista ao VIX.

William Waack acusado de racismo

O apresentador do ‘Jornal da Globo’ foi afastado após acusações de racismo por conta de um vídeo de 2016 que circula na internet, no qual Waack se irrita com uma som de buzina fora do estúdio e diz que “isso é coisa de preto”.

Rapidamente, a emissora substituiu Waack pela jornalista Renata Lo Prete na bancada do programa e emitiu um comunicado explicando a decisão.  Na nota, a Globo afirma que o jornalista não se lembra de ter feito comentários de cunho racista, mas que pede desculpas a quem possa ter se sentido ofendido. A emissora também reforça o seu posicionamento contra o racismo ou qualquer forma de discriminação.

"A Globo é visceralmente contra o racismo em todas as suas formas e manifestações. Nenhuma circunstância pode servir de atenuante. Diante disso, a Globo está afastando o apresentador William Waack de suas funções em decorrência do vídeo que passou hoje a circular na internet, até que a situação esteja esclarecida", diz o comunicado.

O tempo foi curtíssimo entre o início da repercussão do vídeo e a decisão da emissora de afastar o jornalista e se posicionar contra qualquer manifestação de racismo, como explica no comunicado. “Em um caso como esse, Waack representa a própria empresa que, claro, não quer ser associada a comportamentos preconceituosos ou racistas. Ao tomar uma decisão rápida, a empresa defende a si mesma e a sua credibilidade”, explica Antonio.

Recentemente, um caso tão polêmico quanto o de Waack também levantou debates importantes na internet, que exigiu da emissora não só um posicionamento a respeito de um evento “isolado”, mas toda uma reafirmação de ideologia.

Caso José Mayer

A denúncia da figurinista Susllem Tonani contra José Mayer por conta de assédio sexual também despertou uma movimentação social dentro e fora da empresa: além de precisar dar satisfações ao público, a Globo esbarrou também no posicionamento das próprias funcionárias, que iniciaram a campanha “Mexeu com uma, mexeu com todas” contra assédio.

Se antes as opiniões – tanto do público, quanto de famosos – ficavam restritas a um círculo pessoal e se espalhavam pouco, hoje, as redes sociais escancaram insatisfações e manifestações de todos os lados.

“Temas como esse são sensíveis e tocam muito a sociedade. Por isso, existe uma preocupação de aproveitar esses episódios, que são cada vez mais visíveis e incomodam o público, para que a marca reafirme seus valores de forma geral”, pontua o professor.

Marcos Harter, no BBB

Na edição 2017 do Big Brother Brasil, o candidato Marcos Harter foi indiciado e enquadrado na Lei Maria da Penha por ter agredido Emilly Araújo no programa. Depois de investigações, o médico acabou sendo expulso do reality.

Como programa em que o público interfere diretamente, os olhares à forma como a emissora lidaria com o problema ficaram ainda mais atentos. Ainda que de forma “discreta”, o discurso de Tiago Leifert na eliminação de Marcos levantou o posicionamento do canal, não só contra a violência, mas reforçando o apoio a denúncias de vítimas de violência, como Emilly.

Na época, alguns dias se passaram entre o momento decisivo da agressão de Marcos, que vinha crescendo nas semanas anteriores, e a decisão de eliminá-lo do programa.  “É claro que a pressão pelo imediatismo existe e a empresa precisa avaliar o que está envolvido para diminuir os riscos de tomar uma decisão equivocada. Mas é fato que precisa dar uma resposta. Hoje, em casos como esse, não dizer nada ao público é pior”, comenta Antonio.

Manifestações de 2013

Casos como as manifestações de 2013, que se espalharam pelo Brasil levantando os mais diversos tipos de reivindicações, deixam ainda mais nítida a influência da internet na cobertura da imprensa tradicional. Se no início das movimentações grandes veículos deram pouco espaço aos protestos, à medida em que o engajamento social aumentou, não teve jeito: o assunto precisava virar pauta.

“Os protestos de 2013 foram um marco na mudança de comportamento da mídia tradicional em relação à internet. Mesmo que não houvesse intenção proposital de ignorar o assunto, não se sabia da dimensão que ele tomaria”, ressalta o coordenador.

Falas como “isso a Globo não mostra” se tornaram mais do que comuns na época e deram início a um movimento em que o cerco em torno dos grandes veículos fica cada vez mais apertado quando a comunicação entre o próprio público fica cada vez mais intensa. “Vira uma questão de mercado: um veículo de mídia sério simplesmente não pode ignorar assuntos como esse”, pontua.

Campanhas

Mas se por um lado, o peso da opinião pública pode ser uma “pedra no sapato” dos grandes veículos, por outro também pode ser uma nova e gigantesca aliada. Sabendo exatamente o que público quer, a empresa pode escolher qual caminho seguir.

A campanha “Tudo Começa Pelo Respeito” iniciada pela Globo mostra como o interesse público pauta – e muito – o assunto da mídia. A questão do respeito à diversidade sexual, por exemplo, começou a se tornar frequente em novelas, programas jornalísticos, no entretenimento e na própria comunicação da emissora com seu público.

Para Antonio, mais do que pressionar e influenciar, o público diz muito sobre o que a empresa vai falar. “Grandes empresas prestam atenção, sim, na reação do público, que, hoje, é um ponto de partida muito importante para o produto que será entregue. Nos últimos 5 anos houve grandes mudanças de paradigma na comunicação que mexe com algo muito valioso para qualquer empresa: reputação”, pontua Antonio.

Preconceito racial

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