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Ao contrário de "Amor à Vida", "Malhação" é mais real ao retratar autismo na TV

Publicado 24 Mai 2017 – 09:15 AM EDT | Atualizado 16 Mar 2018 – 08:36 AM EDT
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Não é de hoje que as novelas colocam em pauta alguma doença ou síndrome específica, como forma de conscientizar a população e trazer mais representatividade para a TV. Atualmente, em “Malhação”, é a vez da personagem Benê (Daphne Bozaski) ser a protagonista desse assunto, trazendo à tona um distúrbio comum, mas pouco comentado na mídia: a Síndrome de Asperger.

Conhecida como sincera ao extremo e com dificuldades de se relacionar com as pessoas, Benê acaba sempre isolada de algum jeito. Quando ela conhece Keyla (Gabriela Medvedovski), Lica (Manoela Aliperti), Ellen (Heslaine Vieira) e Tina (Ana Hikari) no metrô, a amizade com as meninas acaba trazendo muitos ensinamentos para a personagem, que passa a refletir sobre as atitudes e levanta a discussão sobre a síndrome, que é classificada como um dos tipos de autismo.

A Globo já retratou o autismo em outra produção. Em 2014, a trama “Amor à Vida” teve uma personagem com um quadro grave da síndrome, Linda (Bruna Linzmeyer). No entanto, a abordagem da novela teen tende a ser diferente em alguns aspectos.

Síndrome de Asperger na Malhação

A “Malhação” sempre tratou, com delicadeza e seriedade, temas importantes do universo jovem. Gravidez na adolescência, DSTs e drogas acabam se tornando assuntos recorrentes nas temporadas, que tem como objetivo conscientizar os jovens através do entretenimento.

Na temporada atual, “Viva a Diferença”, algumas mudanças foram percebidas em relação aos anos anteriores da trama. A principal é o protagonismo de cinco meninas, que ficam amigas diante de uma situação inusitada, e passam a conviver juntas em um bairro de São Paulo. Cada uma delas é de um jeito, e possui alguma particularidade que deve ser respeitada.

A síndrome de Benê se manifesta nos pequenos detalhes. Além de ter dificuldades em se relacionar com as pessoas, ela acaba direcionando a atenção para algumas atividades específicas, como a corrida e, posteriormente, a prática de tocar piano. Ela também é muito sincera, fala tudo o que pensa sem nenhum filtro, o que causa constrangimentos em seu grupo de amigos.

Com o tempo, ela descobrirá que tem Asperger, e o objetivo da novela é mostrar isso do jeito mais natural possível. Os próprios sintomas retratados em cena são bem condizentes com a realidade. De acordo com o psiquiatra e psicanalista doutor Mario Louzã, o transtorno causa alterações mais explícitas justamente no âmbito social do paciente.

“São alterações significativas na interação e na comunicação sociais, além de um padrão de comportamento com atividades e interesses restritos e repetitivos”, explica o médico.

O que é a síndrome de Asperger?

Definida como transtorno do espectro autista, o Asperger é uma variação de um vasto conjunto de síndromes semelhantes. “São consideradas doenças do neurodesenvolvimento infantil, juntamente com o Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade, os Transtornos da Comunicação, os Transtornos de Aprendizagem e os Transtornos do Desenvolvimento Intelectual”, explica o especialista.

Geralmente, a síndrome se manifesta ainda na infância, antes dos 3 anos de idade, e não possui uma causa conhecida. Louzã ainda aponta que “há muitos estudos apontando a predisposição genética como importante, associada a fatores ambientais que influenciam o neurodesenvolvimento durante a gestação e o período perinatal”.

Sintomas

Os principais sinais da síndrome estão diretamente relacionados à interação social da criança. “Há uma grande dificuldade ou desinteresse pela relação com outras crianças ou adultos. Os portadores tendem a querer brincar sozinhos, a ficar isolados e podem até apresentar dificuldade variável na comunicação verbal, com eventual atraso na aquisição da linguagem”, segundo o psiquiatra.

Além disso, o contato visual costuma ser evitado, o que passa a sensação de desatenção por parte da criança. Os comportamentos repetitivos também merecem uma atenção especial, de acordo com Louzã, “ou atividades e interesses restritos, como gostar de um único brinquedo, um único tipo de brincadeira, um padrão repetitivo de rotina”. Essas repetições levam ao perfeccionismo, outra característica do Asperger.

Tratamento

Segundo o especialista, o tratamento deve ser exclusivo para cada portador, já que os sintomas da síndrome podem variar. Ele também explica que os tratamentos comportamentais envolvem a ampliação do leque de interesses e o desenvolvimento das habilidades sociais, com a ajuda de orientadores na escola e o estímulo ao convívio social da criança.

“Tratado precoce e intensivamente, dependendo da gravidade da doença, as perspectivas de melhora da síndrome são satisfatórias, com redução significativa dos sintomas e um grau adequado de adaptação social na vida adulta”, conclui Louzã.

Autismo na TV: importância da discussão

Por surgir ainda na infância, os transtornos do espectro autista requerem acompanhamento desde cedo, para evitar que a criança se torne completamente isolada da sociedade. Como em qualquer outra novela, falar sobre síndromes e doenças é um jeito de não só quebrar o tabu sobre elas, mas de gerar uma identificação com os pacientes e portadores, que passam a se enxergar na telinha.

No caso da “Malhação”, a importância é ainda maior, pois Benê descobre a síndrome no início de sua vida social. Claro que cada portador possui um nível de sintomas, mas uma personagem adolescente com um quadro leve já ensina muitas pessoas sobre o que é o Asperger.  É também um jeito de alertar sobre a importância de buscar um tratamento cedo, que faz toda diferença no desenvolvimento do portador.

Polêmica em “Amor à Vida”: relembre

Em 2014, na trama “Amor à Vida”, de Walcyr Carrasco, a personagem Linda (Bruna Linzmeyer) era portadora de um grau avançado de autismo, já na vida adulta. No entanto, a abordagem sobre a síndrome acabou se tornando polêmica entre o público.

Linda tinha uma enorme dificuldade em se expressar, se comunicar e se relacionar socialmente. No entanto, as características da personagem não eram parecidas com as da realidade: ela não teve um acompanhamento desde a infância, o que teria comprometido ainda mais sua situação. Além disso, a jovem se envolve com o advogado Rafael (Rainer Cadete), com quem se casa no final.

Se a personagem tinha uma condição social tão comprometida, ela teria consciência do que é um relacionamento amoroso? Na época, alguns profissionais defendiam que, dependendo da condição do transtorno autista, o portador é classificado como incapaz. Ou seja, qualquer tentativa de aproximação amorosa com um adulto é configurada como abuso de incapaz, um crime descrito no código penal.

Assim, é preciso ter muito cuidado ao retratar síndromes desse tipo na televisão, para não cometer excessos que fujam da realidade. No contexto de Benê, em “Malhação”, a proposta é justamente mostrar o Asperger como parte da vida da personagem, da forma mais verdadeira possível.

Desenvolvimento de Benê na trama

Em “Malhação”, a personagem encontrará um enorme apoio nas “Five”, grupo formado com as outras quatro protagonistas. Além disso, Benê terá um envolvimento amoroso com Guto (Bruno Gadiol), que é também quem a ensina a tocar piano.

Assim, levando uma vida normal e contando com a compreensão dos amigos, a jovem entenderá melhor sua própria condição, e terá um incentivo para desenvolver sua interação social. É isso que faz a diferença no tratamento, de acordo com Louzã. “Sempre que possível a criança deve frequentar uma escola comum, tendo acompanhamento especial só se houver indicação”, conclui.

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