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Quem era Marielle Franco e por que sua morte afeta todas as mulheres no Brasil?

Publicado 15 Mar 2018 – 05:35 PM EDT | Atualizado 15 Mar 2018 – 05:35 PM EDT
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Mulher, negra, mãe e “cria” da favela da Maré. Assim sempre se descreveu Marielle Franco, eleita vereadora da Câmara do Rio de Janeiro com exatos 46.502 votos. Na noite do dia 14 de março de 2018, seu nome apareceu nos noticiários do Brasil e de outros países por conta de um crime bárbaro: ela foi assassinada a tiros quando era levada de carro de um bairro a outro da capital fluminense.

A parlamentar do PSOL, que estava acompanhada do motorista Anderson Pedro Gomes, também vítima mortal dos disparos, e de uma assessora, que conseguiu sobreviver ao ataque, havia acabado de sair de um evento sobre liderança negra feminista, realizado no bairro da Lapa. No momento do crime, os três estavam na região de Estácio, próxima à Prefeitura do Rio, e foram alvo de diversos disparos vindos de outro veículo, que teria emparelhado ao lado do deles.

Quem era Marielle Franco?

Investigada pela Divisão de Homicídios como execução, a morte de Marielle causou comoção nacional entre políticos, líderes sociais, artistas, ativistas e a população em geral. Isso porque, além de ter sido a quinta vereadora mais votada do Rio nas eleições de 2016, ela também participou ativamente na luta pelos direitos das mulheres e da comunidade negra, dedicando seu mandato à defesa das minorias.

Projetos da vereadora

Durante pouco mais de um ano como vereadora, Marielle chegou a apresentar 116 proposições na Câmara do Rio, sendo 16 projetos de lei - dois deles, desenvolvidos junto de outros parlamentares, foram aprovados. Mas entre suas propostas voltadas em prol das mulheres destacaram-se especialmente duas ações. São elas:

- A Lei das Casas de Parto, que estimula a ampliação do número de centros especializados em realizar partos normais na rede pública de saúde, principalmente nas zonas de menor IDH do município. Aprovado na Câmara de Vereadores do Rio, o projeto aguarda sanção do prefeito Marcelo Crivella.

- #AssédioNãoÉPassageiro, projeto de combate ao assédio nos transportes públicos, que prevê diversas ações legais e campanhas educativas sobre a violência sexual contra as mulheres. A proposta segue aberta em votação pública para conseguir ser enviada à Câmara de Vereadores.

Ações dentro e fora da Câmara

Formada socióloga com mestrado em Administração Pública, ela estendeu suas ações na política como presidente da Comissão de Defesa da Mulher na Câmara e autora de um projeto que pediu a criação do Dossiê da Mulher Carioca – documento que obriga a prefeitura a reunir dados sobre a violência de gênero no município do Rio de Janeiro.

Além do empenho na esfera política, Marielle se dedicou a ações de cunho social, organizando audiências públicas e outros eventos de debate sobre racismo, questão de gênero e cultura negra. Sem contar que ela também integrava a Frente Parlamentar da Economia Solidária, focada em pensar políticas públicas de fortalecimento de uma economia mais justa e consciente.

Pouco antes de ser morta, a vereadora ainda assumiu uma nova função: o papel de relatora da Comissão da Câmara de Vereadores, que acompanhava toda a intervenção federal na segurança pública do Rio de Janeiro. Posicionando-se publicamente contra a medida, ela criticou diversas vezes a situação através das redes sociais.

“Mais um homicídio de um jovem que pode estar entrando para a conta da PM. Matheus Melo estava saindo da igreja. Quantos mais vão precisar morrer para que essa guerra acabe?”, escreveu ela em seu Twitter, exatamente um dia antes de seu assassinato.

Maioria da população, minoria em cargos de poder

A morte de uma figura tão emblemática como Marielle, justamente no mês em que foi comemorado o Dia Internacional da Mulher, faz levantar a (inquietante) questão sobre a representatividade feminina na sociedade e, principalmente, na política brasileira. 

É que a vereadora simboliza a ínfima parcela de mulheres que conseguiram alcançar um cargo de liderança - sendo que, embora representem a maioria da população no Brasil, as mulheres ainda são minimamente presentes no poder público, majoritariamente dominado por homens brancos de classe mais alta. 

“A mulher brasileira está fora do Legislativo, não participa da cúpula do Judiciário e está fora do Executivo. Nós não povoamos os Ministérios Federais, como não povoamos as Secretarias Municipais, nem as Estaduais. Estatisticamente falando, nós não participamos de nenhum dos três níveis governamentais”, afirma Raquel Preto, advogada e líder dos comitês de cultura e de combate à violência contra a mulher, do Grupo Mulheres do Brasil.

Uma voz calada na sociedade

De acordo com a especialista, ao ficar ausente das tomadas de decisão, a mulher não tem qualquer influência em questões fundamentais que podem afetar diretamente em sua vida. “Em um país em que 51,6% da população é formado por mulheres, é absolutamente inacreditável que a gente tenha uma participação legislativa de apenas 9,9%”, reitera.

“A execução da Marielle nos traz uma simbologia muito forte, porque ela era uma voz que causava impacto, que confrontava. Naquele momento, ela estava no exercício de sua legislatura, no exercício do cargo ao qual ela ascendeu por vontade popular. Já é tão difícil para uma mulher caminhar na direção desses cargos, que são relevantes e têm uma parcela de decisão que influencia no presente e no futuro da nação”, analisa Raquel.

Diante da importância e relevância de Marielle nesse contexto, a advogada e ativista aponta o impacto do caso no aumento da sensação de insegurança e injustiça no País. Porém, ela reforça a necessidade de manter a luta pelos direitos das mulheres, para que o exemplo da vereadora nunca seja apagado.

“Independentemente de bandeira partidária, raça, convicções ideológicas ou nível social, estamos falando de um ser humano e todo ser humano merece respeito, indistintamente. As mulheres, maioria da população, estão tão mal representadas que, a aniquilação de uma das nossas representantes é ainda mais grave”, conclui.

Presença feminina em espaços de liderança

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