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Precisou de quase 10 anos para Dolabella ir do prêmio milionário ao grupo de reflexão

Publicado 10 Abr 2017 – 11:45 AM EDT | Atualizado 27 Mar 2019 – 09:08 AM EDT
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O ator Dado Dolabella, condenado por violência contra a mulher depois de agredir a atriz Luana Piovani, então sua namorada, em 2008, está cumprindo sua pena em liberdade. Mas, para isso, ele precisa seguir à risca o que foi estabelecido pela juíza Ana Paula Delduque, do 3º Juizado de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher do Fórum Regional de Jacarepaguá, no Rio de Janeiro.

Uma das determinações é a presença em palestras sobre violência doméstica em um grupo. "O grupo reflexivo de gênero para homens em situação de violência doméstica tem como principal objetivo prevenir e estimular o rompimento do ciclo da violência, por meio da reconstrução de identidade e da relação de gênero baseada no processo de reflexão responsabilizante. Tem por objetivo, ainda, desnaturalizar a prática de ações violentas de diversas espécies", explica a juíza.

O caso público de Dado Dolabella contra Luana Piovani é um bom exemplo para observar as transformações sociais que vivemos ao longo desses anos. Mudou, em quase dez anos desde a denúncia original, tanto a forma como a Justiça trata a violência contra a mulher até o julgamento moral da sociedade.

Desabafo de Luana Piovani

Recentemente, a atriz lançou um canal no YouTube, o "Luana sem Freio", para discutir desde questões triviais até grandes temas da atualidade junto com seus seguidores. No dia 3 de abril, ela decidiu falar sobre a denúncia de assédio contra o ator José Mayer, que repercutiu na imprensa, foi alvo de protesto e culminou com uma carta aberta do ator, pedindo desculpas.

O episódio serviu para Luana relembrar a agressão sofrida em 2008 e questionar a forma como o ex-namorado foi tratado pela opinião pública: "Dado Dolabella enfiou a mão na minha cara, eu fui para o mundo inteiro contar, seis meses depois, ele ganhou R$ 2 milhões na "Fazenda", votado pelo telefone, pelas pessoas", falou em tom de revolta.

A atriz relembrou sua própria experiência de violência para alertar sobre o silenciamento das vítimas: "A gente precisa quebrar o silêncio. A gente precisa tomar as rédeas das nossas vidas pelas mãos, em todas as empresas, em todos os lugares. Você imaginam como eu me senti quando Dado Dolabella ganhou R$ 2 milhões, seis meses depois dele ter enfiado a mão na minha cara? Assédio sempre existiu, porém o silêncio também", afirmou.

Assista ao vídeo com o desabafo de Luana Piovani:

Grupo de reflexão sobre violência contra a mulher

De lá para cá, grupos sociais, figuras públicas, representantes do Direito e da luta por igualdade de gênero estão se esforçando para desnaturalizar a violência doméstica, não deixar que um episódio como esse se transforme num espetáculo midiático, que haja punição e, especialmente, conscientização. Uma das estratégias para ressignificação da violência contra a mulher é justamente a criação desses grupos de reflexão para homens que estão envolvidos em episódios violentos.

Nas reuniões, acontecem discussões reflexivas que visam realizar esforço de se pensar em outras vias de solução de conflitos que não passem pela violência.

Os grupos são coordenados por uma equipe técnica do juízo, composta por assistentes sociais e psicólogos, que têm liberdade para eleger as ferramentas mais adequadas para atingir o objetivo de cada reunião. "Isso permite que o homem seja trabalhado no grupo, que o grupo seja trabalhado pelo facilitador e o próprio grupo realize a ação reflexiva. O facilitador possui a função de propor atividades geradoras de reflexões, devolvendo sempre para o grupo as questões postas em discussão no sentido de estimular um processo de construção coletiva de consenso e de democratização das relações", conta.

A juíza explica ainda que o grupo reflexivo tem sido uma prática constante no 3º Juizado de Violência Doméstica e Familiar, principalmente em virtude da ressignificação de mundo privado e mundo público após a Lei Maria da Penha, que criminalizou a violência que ocorre no âmbito doméstico. São oito encontros quinzenais, com duração de duas horas, realizados em espaço próprio. E podem participar até 15 homens por grupo. "Cada reunião cumpre um objetivo específico de acordo com o encadeamento do tema proposto. Os encontros são precedidos de entrevista individual de cada um dos participantes, para identificar o perfil do grupo a ser realizado. Nessa oportunidade recebem todas as informações relativas ao funcionamento", diz.

Os encontros têm como base a literatura de Paulo Freire, que associa temas e conceitos com a experiência cotidiana do universo da pessoa, favorecendo diálogos através de perguntas e dinâmicas, possibilitando a transformação de identidades e o cotidiano dos homens em situação de violência doméstica. "Freire sugere que a pergunta seja um instrumento de diálogo e geradora de novas perguntas e reflexões".

Pena para violência doméstica

A imposição para que um réu participe desses encontros, de acordo com a juíza, é cabível quando houver a possibilidade de concessão do benefício de suspensão condicional da execução da pena previsto no artigo 77 do Código Penal. "Para ser agraciado, o condenado não poderá ser reincidente em crime doloso, a sua culpabilidade, antecedentes, conduta social e personalidade têm de ser favoráveis e a pena privativa de liberdade imposta não pode ser superior a dois anos", explica.

Ela ressalta também que os resultados positivos do trabalho coletivo podem ser concretamente verificados, haja vista o baixíssimo índice de reincidência. "No caso específico do reeducando Carlos Eduardo Dolabella [Dado Dolabella], é importante destacar que a participação de pessoas de domínio público no Grupo Reflexivo de Gênero é relevante, na medida que evidencia para aqueles que são anônimos a igualdade perante a lei e à Justiça que, via de regra, não conseguem perceber", finaliza.

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