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Contrato, selfie e até máscara de cachorro: tudo sobre o caso Bruno só fere a todas nós

Publicado 14 Mar 2017 – 06:22 PM EDT | Atualizado 14 Mar 2018 – 09:19 AM EDT
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Seriam 22 anos e três meses de prisão. Mas foram apenas seis anos e sete meses. O ex-goleiro Bruno foi solto antes de cumprir toda a sua pena por, segundo o STF (Superior Tribunal Federal), já ter muito tempo de prisão provisória sem ter seu recurso julgado. Desde então, os acontecimentos em torno do caso evidenciam uma triste realidade: a sociedade ainda banaliza a violência contra a mulher, mesmo se escancarada e brutal.

Entenda o caso

Eliza Samudio desapareceu em 2010. O ex-goleiro foi preso no mesmo ano acusado de envolvimento na morte brutal dela, com quem o jogador havia tido um filho, mas se negava a reconhecer a paternidade e a pagar pensão. No ano anterior, a vítima chegou a prestar queixa na delegacia, mas teve seu pedido de proteção negado.

Eliza foi assassinada por estrangulamento. Posteriormente, foi esquartejada e teve seu corpo ocultado. A condenação saiu em 2013. Bruno foi condenado em primeira instância a 22 anos e três meses de prisão por homicídio triplamente qualificado. Ele deveria permanecer em regime fechado por pelo menos 17 anos.

Em fevereiro de 2017, depois de cumprir seis anos e sete meses, no entanto, Bruno foi solto por decisão do ministro do STF Marco Aurélio Mello, que alegou demora no tempo de espera para o julgamento do recurso da defesa.

Desde então, formou-se um verdadeiro espetáculo em torno das notícias que envolvem o nome do goleiro. Elas causam espanto, indignação, mas só evidenciam o tratamento banal que a violência contra a mulher recebe até os dias de hoje.

Proposta de emprego

Mesmo antes de sair da prisão, o advogado do ex-jogador declarou à imprensa que o goleiro estava negociando com nove times de futebol – três de Minas Gerais, três do Rio de Janeiro, dois de São Paulo e um de Brasília.

Contratação

Menos de uma semana após sua saída, a notícia: o ex-goleiro foi contratado pelo Boa Esporte Clube de Varginha.

Em resposta à repercussão negativa, o time perdeu todos os seus patrocinadores, entre eles o Grupo Góis e Silva. Em nota oficial, a empresa disse que repudia qualquer tipo de violência contra a mulher.

De frente a estas situações, alguns questionamentos são inevitáveis. Em um país onde 13 mulheres são assassinadas por dia e, portanto, o combate ao feminicídio é urgente e essencial, qual é a motivação para clubes irem atrás de uma pessoa acusada de contribuir para essas tristes estatísticas e tratarem o episódio como uma simples contratação de um jogador de futebol que esteve um tempo afastado?

Bruno estava sem jogar porque estava preso. Estava preso porque foi acusado de ser o mandante da obscura morte de uma mulher. Ele continua em julgamento e pode ser preso novamente caso o recurso seja negado em segunda instância.

Atitudes como essa são a maior prova de que a vida das mulheres, infelizmente, não tem valor e que mesmo a retirada dela pode ser superada em pouco tempo, sem muitas consequências. É um desrespeito com as torcedoras do Boa Esporte. É um desrespeito com todas as mulheres.

Posicionamento de Bruno após o cárcere

Além das oportunidades profissionais, o posicionamento de Bruno também é um grande exemplo da maneira como não só os crimes, mas todas as violências pelas quais as mulheres são submetidas todos os dias, são encaradas. Em entrevistas e coletivas de imprensa, o jogador pediu para que as pessoas esquecessem o ocorrido porque “cobram muito pelo que aconteceu no passado”, mas “o pior já passou”, como se fosse aceitável esquecer a brutalidade do crime contra Eliza em nome de uma carreira no esporte.

Nas aparições públicas, o goleiro, além de evitar tocar no assunto ou dizer que quer “seguir sua vida” (Eliza teve essa escolha?), ainda diz que, depois de pedir o teste de paternidade do Bruninho, filho fruto do relacionamento extra-conjugal com a vítima, quer “lutar pela guarda dele”.

Reação popular

Mas, talvez o pior seja ver, infelizmente, que não é todo mundo que enxerga o caso de maneira incrédula. Embora grande parte esteja indignada, ainda há aqueles que manifestaram apoio ao goleiro. Seja pelas redes sociais ou presencialmente.

Quando foi liberado da prisão e encaminhado até o fórum, pessoas abordaram o goleiro para a captura de uma “selfie”, como se ele fosse uma celebridade.

E o pior: no mesmo momento ele ainda recebeu o “apoio” de um homem que vestia a máscara de um cachorro (algumas linhas de investigação desconfiam de que partes do corpo de Eliza foram dadas como alimento a alguns cachorros). De acordo com informações do jornal mineiro Hoje em Dia, o homem queria “fazer uma homenagem”.

A piada é um dos meios mais eficientes de perpetuar determinados preconceitos enraizados na sociedade. Até quando faremos piada com a morte das mulheres?

Violência contra a mulher

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