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9 lugares do mundo que transformaram cinza em verde e concreto em áreas de lazer

Publicado 5 Ago 2016 – 06:30 PM EDT | Atualizado 13 Mar 2018 – 04:42 PM EDT
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A matemática é simples. “Pessoas geram muito menos impacto ao meio ambiente do que automóveis”. E é sabido que áreas verdes são responsáveis por qualidade do ar e, consequentemente, influenciam diretamente na vida da população.

As aspas acima são da Prof. Dra. Maria Lúcia Refinetti, pesquisadora da área de Meio Ambiente e Assentamentos Humanos, Legislação Urbanística e Ambiental, Políticas Habitacionais no Brasil e na América Latina, da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (USP). Segundo ela, a necessidade de reverter esses impactos negativos e aproveitar melhor o espaço urbano tem se tornado uma urgência nas metrópoles mundiais. “Estamos diante de um movimento mundial para usufruir a cidade, que vem se fortalecendo desde a década de 80. Viemos de uma época em que tudo foi organizado pensando no automóvel, e que, agora, começa a ‘sufocar’ o bem-estar das pessoas”, explica a pesquisadora.

Não à toa, muitas cidades estão transformando o que antes era só concreto em áreas de lazer, estimulando o convívio e também colorindo o cinza com o verde de jardins. Confira alguns espaços ao redor do mundo que mudaram totalmente sua aparência.

Lugares do mundo que mudaram a relação das pessoas com a cidade

Avenida Paulista - São Paulo (SP), Brasil

Uma das mais recentes mudanças no mundo aconteceu no cartão postal da cidade de São Paulo. A Avenida Paulista se tornou um dos pontos mais importantes do programa municipal Ruas Abertas, que tem como objetivo impulsionar a ocupação dos espaços públicos da cidade. O trânsito é desviado da avenida aos domingos, das 9 da manhã às 5 da tarde, e ela fica totalmente aberta à circulação de pessoas, que usam o espaço para se exercitar, passear ou mesmo participar de intervenções artísticas. Isso acontece há pouco mais de um ano e, em pesquisa do Datafolha, 75% dos moradores da capital paulista afirmaram já ter aproveitado a avenida fechada.

Elevado Presidente João Goulart - São Paulo (SP), Brasil

O Elevado Presidente Costa e Silva (rebatizado recentemente de Elevado Presidente João Goulart), popularmente conhecido como Minhocão, foi inaugurado em 1971, durante a gestão do prefeito Paulo Maluf. Desde que foi erguido gerou muita polêmica entre a opinião pública, sendo considerado uma intervenção brusca na arquitetura da cidade, que desvalorizou a área até mesmo economicamente. Já a partir de 1976, a via começou a ser interditada em horários determinados para evitar acidentes de trânsito e diminuir o barulho para moradores da região.

Desde 2010 tramitam projetos para demolir o Elevado ou para transformá-lo em um jardim suspenso. Enquanto nada é decidido, atualmente o Minhocão fica fechado para os carros e livre para a população aos sábados a partir das 15h, domingos o dia todo e durante a semana na madrugada, entre 21h30 e 6h30.

Montreal, Canadá

Na cidade de Montreal, uma das mais importantes do Canadá, contêineres de carga que seriam descartados estão sendo usado como espaços de convivência. Eles ocupam algumas vagas de carros nas ruas da cidade e contam com mesas para refeição, leitura, descanso, entre outras atividades. A decoração também fica por conta de artistas locais.

Projeto Summer Streets - Nova Iorque, Estados Unidos

O Summer Streets é um evento que acontece anualmente, em agosto, e libera ruas para pedestres entre a ponte do Brooklyn e o Central Park – dois dos pontos mais importantes da cidade. São oferecidas atividades recreativas durante o período da manhã, entre 7h e 13h. Nesse tempo, são realizadas caminhadas e corridas e os cidadãos podem utilizar o espaço para atividades de lazer.

Calçadão Urbanoide - São Paulo (SP), Brasil

Um antigo estacionamento de 1.000 m² entre a Rua Augusta e a Frei Caneca foi transformado em uma praça de alimentação ao ar livre, deixando de ser apenas concreto e se tornando um amplo espaço de convivência. Ele recebe quase 30 barracas, trailers e foodtrucks, que movimentam o comércio e estimulam a livre circulação da população.

Conselho Municipal de Estocolmo - Estocolmo, Suécia

O prédio do Conselho Municipal de Estocolmo, capital sueca, foi construído em 1923 e abriga algumas das organizações administrativas da cidade. No entanto, os gramados, jardins e alguns espaços internos do prédio deixaram de ser apenas um enorme “efeite” e foram abertos à população, que pode usa-los para prática de atividades recreativas.

Rua São Francisco  - Curitiba (PR), Brasil

Todas as quintas-feiras, a rua, que fica no centro histórico da capital paranaense, recebe uma série de atividades voltadas à população, como festivais gastronômicos, palestras e exposições  e fica fechada para veículos a partir das 16h.

Estação das Docas - Belém (PR), Brasil

O antigo armazém do porto fluvial de Belém foi revitalizado para se tornar a Estação das Docas que, hoje, é referência em espaço de lazer, cultural e de turismo. A área conta com shows musicais, apresentações teatrais, circuitos de cinema, festivais gastronômicos, entre outras atividades.

High Line - Nova Iorque, Estados Unidos

Trata-se de um jardim suspenso construído em 1999 sobre uma linha de trem abandonada. Além do jardim, foram instalados bancos de leitura e descanso e, aos poucos, galerias, museus, lojas e restaurantes começam a tomar o lugar de fábricas abandonadas que ficavam em torno da via.

Quais os benefícios disso ao meio ambiente? 

Os automóveis são responsáveis pela emissão de quase todo o monóxido de carbono presente no ar – e esse gás, em concentrações maiores, é tóxico e perigoso para a saúde. Além dessa consequência facilmente mensurável, o número exorbitante de veículos ainda trás outras consequências sociais e ambientais, como o isolamento, a transformação de trechos urbanos em meros corredores de carros e a diminuição do olhar mais atento das pessoas à paisagem ao redor, o que reduz a empatia pelo lugar. Tudo isso transforma a cidade em um ambiente cada vez mais hostil e estressante. “É fundamental agora olhar para esse fator ambiental não apenas como o ‘verde’, mas também como qualidade de vida”, comenta Maria Lúcia.

A diminuição da circulação de veículos é positiva. No entanto, é fundamental também a conscientização ambiental da população. “Em países desenvolvidos, é muito forte nas pessoas que o espaço público é responsabilidade de todos e que elas precisam se preocupar com a manutenção dele e com o cuidado para mantê-lo limpo e preservado”, completa.

Nesse sentido, Maria Lucia aponta que enxerga a ocupação do espaço público como uma grande oportunidade de educar e conscientizar ambientalmente. “Já fui moradora de uma rua aberta ao lazer e acho o espaço público importante para mudar a visão que o brasileiro, em geral, tem do que é público: em vez de vê-lo como ‘terra de ninguém’, passar a protegê-lo como um bem que também é de cada um. Essa é uma lição que podemos tomar de países desenvolvidos, em que é muito forte nas pessoas a ideia de que o espaço público é responsabilidade de todos e que elas precisam se preocupar com a manutenção dele”, conclui.

E às pessoas?

Apesar de pública, a cidade ainda é dominada pelo particular: carros, motocicletas, shopping centers e lojas, por exemplo, pautam o espaço no consumismo e, dado o índice de desigualdade social, cavam ainda mais o abismo que separa as camadas sociais. Nesse sentido, a abertura das ruas ainda pode ajudar a ampliar o acesso ao lazer a à cultura.

“Podemos pensar em uma democratização do espaço no sentido de ampliar a participação de diferentes grupos e setores sociais em um único lugar. É preciso sempre reforçar que lazer não é igual a consumo e que em uma sociedade extremamente baseada nisso, ter um espaço que não torna o consumo obrigatório é importante para sensibilizar e promover o simples contato humano com pessoas que não fazem parte do mesmo universo no dia a dia, mas que podem compartilhar o espaço, nem que seja simplesmente para aproveitar o sol”, comenta a professora.

Quanto custam essas iniciativas? 

Qualquer intervenção no funcionamento da cidade, é claro, tem um custo. No entanto, a abertura do espaço à população pode ser benéfica até mesmo aos cofres públicos. “É claro, se há circulação mais intensa de pessoas são necessários gastos com segurança, limpeza, manutenção do espaço e fiscalização, mas se formos contar o preço da desapropriação de uma área para a criação de um parque, por exemplo, o custo-benefício de abrir uma rua é inacreditavelmente menor”, ressalta a pesquisadora.

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