Jogar videogame é profissão e dá muito dinheiro: conheça o mundo dos e-Sports
Quando pensamos em atletas, imediatamente nos vêm à mente a imagem de grandes jogadores de futebol, de vôlei, nadadores, corredores e outros campeões olímpicos, mas um outro tipo de esportista, apesar de ainda pouco conhecido do grande público, tem ganhado notoriedade – e muito dinheiro. Trata-se do segmento gigante dos cyber atletas: profissionais competitivos que têm os computadores como principal instrumento de trabalho. De maneira mais leiga, são os jogadores profissionais de videogame.
Apesar de parecer um universo completamente à parte, são muitas as semelhanças entre os atletas tradicionais e os profissionais de e-Sports: com rotina regrada, os jogadores precisam se dedicar aos treinos, ao entrosamento com a equipe e também passam pelas pressões e recompensas do calendário de competições, além de lidar com patrocinadores, entre outras questões. Entenda como funciona o universo dos esportes eletrônicos.
Como surgiu o lucrativo mercado dos e-Sports
O conceito de “esporte eletrônico” é relativamente novo, já que veio, claro, junto com a evolução tecnológica. Trata-se de competições organizadas em videogames, especialmente em jogos coletivos que envolvem estratégia e combate em tempo real.
Apesar de ser uma indústria que ainda dá seus primeiros passos, os esportes digitais já são extremamente lucrativos. Estima-se que o mercado de e-Sports tenha lucrado mais de 460 milhões de dólares - cerca de R$1,6 bilhão - em 2016, alcançando um público total de mais de 225 milhões de pessoas.
Com o tempo, a “brincadeira” entre times amadores na internet ficou séria e foi a partir dos anos 2000 que o cenário deixou de ser um nicho muito especializado para se espalhar.
Posteriormente, o surgimento de jogos como League of Legends, DotA e Counter-Strike ajudou a atrair um público cada vez maior com fórmulas parecidas. Os games online reúnem times em missões que, com alto grau de complexidade, começaram a dar prestígio aos vencedores e formar uma comunidade engajada.
Com um público tão grande e apaixonado, era de se esperar que o negócio crescesse e se estruturasse. Assim, ao longo dos anos, uma infinidade de equipes surgiu e disputou espaço de destaque entre os atletas. Campeonatos começaram a ser organizados, transmitidos e cada vez mais procurados. E assim ficou pronta a base de uma indústria milionária, que tirou adolescentes apaixonados por videogame de seus quartos em casa e os colocou em estádios lotados, com status – e salário - de celebridade.
Salários dos atletas profissionais de videogame
De acordo com levantamento do portal eSportsEarning, que lista os jogadores mais bem-pagos do mundo, o faturamento mais alto do mundo pertence ao norte-americano Saahil Arora, profissional em DotA 2, que rende mais de 2 milhões de dólares por ano (cerca de R$ 6,6 milhões). As primeiras colocações da lista são dominadas por outros americanos e coreanos, cujos faturamentos já batem a marca de 1 milhão de dólares (R$ 3,5 milhões).
Alguns brasileiros também figuram na lista dos mais bem-pagos, como os jogadores de CounterStrike Gabriel Toledo, o FalleN, e Marcelo David, conhecido como Coldzera. De acordo com os dados do eSportsEarning, o faturamento de cada um deles alcançou de 420 mil dólares - aproximadamente R$ 1,3 milhão - ao ano.
Uma fatia de mercado dessa, claro, também já atraiu umas algumas pessoa que, de fora, vêm seu potencial. Recentemente, o jogador Ronaldo se tornou um dos investidores do clube CNB, um dos maiores do país. O jogador Neymar também já se declarou fã de e-Sports e chegou a jogar com FalleN – na época, boatos deram conta de que o jogador de futebol também estaria interessado em investir no segmento.
Em partida silenciosa, MicaO e Yang jogam um contra o outro
Como virar jogador profissional?
Entre alguns dos principais clubes do Brasil está a INTZ. Fundada em 2014, a empresa gerencia equipes profissionais e amadoras de diversos e-Sports. Um dos atletas do clube é Gabriel “Turtle” Peixoto, de 22 anos – profissional meio “sem querer”, o jogador foi convidado para participar de um campeonato de League of Legends em 2014 e, a partir daí, o hobby virou trabalho. “Comecei a ter uma rotina de verdade de treinos, levar o jogo a sério, praticar durante horas por dia não mais para me divertir, mas para aprender. É o que faço até hoje”, explica em entrevista ao Vix.
Essa é basicamente a trilha que os jogadores profissionais seguem: são jovens que gostam e acumulam muitas horas em um determinado jogo, o que faz com que alguns deles se destaquem pelo talento. Os clubes e profissionais ficam de olho e acabam “pescando” esses talentos em partidas casuais. Além disso, processos seletivos - como se fossem "entrevistas de empregos" ou peneiras de futebol, por exemplo - também são um canal para quem quer se profissionalizar.
Carreira em ascensão
E para Gabriel, o e-Sport está longe de ser apenas uma moda passageira e o cenário profissional só tende a crescer nos próximos anos. “É uma carreira em ascensão porque é uma área que as novas gerações gostam cada vez mais”, explica. E ele tem razão: a indústria dos videogames de maneira geral tem se mostrado em uma crescente. No ano passado, o YouTube fez um grande investimento no segmento e lançou a plataforma YouTube Gaming, especialmente direcionada à criação e conteúdo de games.
Gabriel explica que parte do faturamento dos jogadores vem justamente desse conteúdo. Através de plataformas de transmissão, os pro players ganham visibilidade e fazem sua renda – em um esquema semelhante ao dos YouTubers, que faturam com publicidade e número de visualizações. “Temos salário, mas o dinheiro vem também de patrocínios, transmissões, eventos e premiações. Tudo isso está relacionado ao nome e impacto que o jogador causa no cenário, além da experiência”, conta.
Dinâmica dos campeonatos
Entre as fontes de renda dos jogadores, também estão os prêmios em dinheiro oferecidos em competições. O Campeonato Brasileiro de League of Legends (CBLoL), um dos principais do País, chega a oferecer uma recompensa de até R$ 70 mil reais aos vencedores de cada fase. A competição funciona, de certa maneira, como um campeonato de futebol: diversas equipes se enfrentam em rodadas eliminatórias – existem, inclusive, classificações semelhantes à Série A e Série B de acordo com as vitórias dos times nos chamados “splits”, fases da competição.
Mas isso não é nada se comparado a outras competições mundiais: a edição 2016 do campeonato Halo World Championship pagou 2,5 milhões de dólares (R$ 8,2 milhões). Já o campeonato mundial de DotA 2 distribuiu mais de 20 milhões de dólares (R$ 66 milhões) entre as equipes finalistas. Os prêmios são divididos entre os jogadores de acordo com a dinâmica do time e posições dos players dentro das equipes.
Melhores momentos em partida da INTZ contra g3 em campeonato de League of Legends
Gaming houses: convivência em grupo
Em games de estratégia, a sintonia e o entrosamento entre a equipe é fundamental para armar um jogo completo. Esse é um dos principais motivos que reúnem os cyberatletas em Gaming Houses: são, basicamente, repúblicas em que os garotos moram e treinam. Boa parte dos clubes conta com uma casa desse tipo – a da INTZ, por exemplo, fica em São Paulo.
Já imaginou algumas dezenas de garotos – adolescentes e jovens – morando e convivendo pessoal e profissionalmente praticamente o tempo todo? Sem organização, um estalo basta para que a rotina vire um caos. É por isso que uma das principais figuras no dia a dia dos times é o mind coach, um psicólogo que vai ajudar a manter a disciplina – e a sanidade – entre os jogadores.
Além desses profissionais, “as casas de games” são investimentos altos dos clubes, funcionam como local de trabalho, portanto, existem regras quanto a visitas, horários de lazer e de treinamento – que, além dos jogos, também incluem academia, transmissões e análises de jogos de adversários.
“É um trabalho constante tanto em grupo quanto individual para acompanhar os jogadores e maximizar seu desempenho, trabalhando tanto características pessoais, como controle emocional, disciplina e organização; quanto do grupo, como bom relacionamento e união. Existem conflitos, claros, mas o senso autocrítico muito elevado é uma característica comum entre eles”, explica o psicólogo Claudio Godoi, mind coach na INTZ.
De acordo com o profissional, lidar com o estresse causado pela convivência e pela pressão do jogo em pessoas tão jovens nem sempre é uma tarefa fácil. “É comum que eles fiquem muito ansiosos antes de partidas importantes, acabem se estressando nos treinos ou descontando em outros jogadores. Insônia e dificuldade de concentração também são sintomas a que precisamos estar muito atentos em relação aos meninos”, conta Claudio.
Com um público tão expressivo, os jogadores também acabam recebendo uma grande carga de atenção – negativa e positiva - e fica a cargo do mind coach manter os atletas com os pés no chão. “São garotos que vivem a fama em uma passagem delicada da vida e os aspectos positivos e negativos vêm pesados. E há a questão financeira também. Por serem muito jovens, é a família que ajuda muito nesse sentido, na hora de administrar todo esse dinheiro”, pontua.
Depois que o hobby vira profissão? Geralmente eles passam longe dos games nas horas livres. “Ainda tem como jogar só para relaxar, é meio automático, mas não é algo que gosto muito de fazer. Para relaxar prefiro ver um seriado, um filme ou só ficar com os amigos”, conta, com simplicidade, Gabriel.
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