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Modo como a morte é retratada em "Bom Sucesso" ensina valiosas lições a todos nós

Publicado 17 Jan 2020 – 11:58 AM EST | Atualizado 22 Jan 2020 – 12:24 PM EST
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A novela " Bom Sucesso", que termina na próxima sexta-feira (24), foi um dos maiores sucessos da Rede Globo dos últimos anos. Ainda que tenha todos os dramas típicos das novelas, como envolvimentos amorosos e traições, um dos temas centrais da obra dos autores Rosane Svartman e Paulo Halm é um tabu — a morte.

Alberto, interpretado por Antônio Fagundes, é um dos protagonistas e enfrenta uma doença terminal. Especialistas afirmam que o retrato feito por Bom Sucesso é muito positivo e pode ensinar lições valiosas aos telespectadores.

A morte em "Bom Sucesso"

Logo no começo da novela, os exames de Paloma (Grazi Massafera) e Alberto são trocados — ele acredita que está bem e ela acha que tem pouquíssimo tempo de vida. Logo o erro é descoberto, o que causa a aproximação dos personagens. Ele, então, tenta dar novo significado à sua vida a partir do encontro com a costureira.

“É uma novela muito intensa, a forma como eles abordam a morte é muito interessante”, diz a advogada Cynthia Araújo, que fez seu doutorado sobre a saúde no contexto do câncer e fim de vida.

A morte por si só é um tema recorrente em novelas e programas de TV, mas não da maneira como é retratada em “Bom Sucesso”. Alberto aceita seu fim com serenidade e não busca uma cura milagrosa para a sua doença.

Em uma das cenas, Mauri, médico do milionário, fala sobre uma nova terapia que eles poderiam tentar, já que a quimioterapia não estava mais fazendo efeito. Animada, Paloma incentiva o amigo a fazer, afirmando que ele irá sobreviver.

O médico, então, explica que não é bem assim. O tratamento poderia garantir mais tempo de vida ao empresário, mas não curá-lo. “Essa compreensão é muito importante porque é extremamente pequena na sociedade”, conta a advogada.

É difícil entrar em contato com uma história em que um tratamento inovador seja capaz “apenas” de garantir uma sobrevida, e não a cura completa. Não é isso que o público está acostumado a ver e a entender como um final feliz.

“É muito bom ter isso na novela das 7, faz com que as pessoas discutam, conversem sobre isso na mesa de jantar, pensem sobre a morte. É um convite para olharmos para nossa própria vida”, diz Ana Cláudia Quintana, médica geriatra e especialista em Cuidados Paliativos.

Ana Cláudia é autora do livro "A Morte é Um Dia Que Vale A Pena Viver", em que fala um pouco sobre o que aprendeu sobre a vida ao longo dos anos anos cuidando de pessoas que estavam perto de morrer. Sua obra, inclusive, é citada na novela por Alberto, que afirma estar lendo o livro.

Em uma cena com Vera, interpretada por Ângela Vieira, Alberto diz que, enquanto estiver lúcido ao lado dos filhos e dos entes queridos, tudo bem. Ele só não queria ficar meses em uma cama ligado a tubos e sem consciência.

“Você tem o direito de decidir como quer viver seus dias, e isso é dignidade. O saudável é a dignidade”, afirma a médica. Quando uma pessoa fica muito doente, é comum que sua autonomia seja podada. Alberto faz a escolha de como quer viver o resto de sua vida e isso é de extrema importância.

Familiares e amigos, muitas vezes, tem dificuldade em aceitar tais decisões. “Eles não fazem por mal, acham que estão protegendo”, explica Ana Cláudia.

Na novela, Alberto passa por várias situações assim. Sua filha, Nana, interpretada por Fabíula Nascimento, reluta em aceitar as vontades do pai, como na cena em que ela não quer de jeito nenhum que ele vá a uma feijoada.

“É importante compreender que uma pessoa nessa situação não está morrendo, ela está vivendo até que morra”, reforça a especialista. Ou seja: Alberto ainda tem vontades, sonhos, coisas que gosta e que não gosta. E é saudável mostrar que ele tem essa autonomia.

Outro ponto importante, segundo a especialista, é a presença de Sofia, neta de Alberto, interpretada por Valentina Vieira. “As crianças geralmente são excluídas desses momentos, elas não podem ficar perto, não fazem parte”, diz Ana Cláudia.

Mas, como diz a médica, é muito benéfico que os pequenos aprendam a conviver com a morte, afinal, elas não serão poupadas quando crescerem. Em uma cena emocionante, o editor acalma a neta que fica angustiada com a partida próxima do avô. Juntos, eles leem um poema de Santo Agostinho sobre a morte (veja abaixo).

André Filipe Junqueira, médico paliativista e presidente da Academia Nacional de Cuidados Paliativos, também elogia a novela. “A morte não é romantizada, mas mostra uma aceitação muito positiva por parte do Alberto. Muitas vezes, o paciente fica muito frustrado, com um sentimento de impotência muito grande”.

Apesar de discutir a morte, a novela valoriza a vida, como diz o médico. Ao realizar seus desejos, ficar em contato com as pessoas queridas, conversar e amar, Alberto mostra que a perspectiva da morte, apesar de triste, não precisa paralisar ninguém.

André ressalta a importância dos cuidados paliativos nessa fase da vida: “O médico não deve tirar as esperanças, nem dar falsas esperanças, mas sim ajudar a buscar um sentido pra vida, a ir em paz”. O foco do atendimento paliativo, como ele conta, não é a morte — é a vida.

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