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Relato de Maria Flor sobre namoro com Jonathan Haagensen levanta sério debate

Publicado 18 Fev 2019 – 03:46 PM EST | Atualizado 18 Fev 2019 – 04:24 PM EST
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Os atores Maria Flor e Jonathan Haagensen já tiveram um namoro de três anos e o período do relacionamento foi relembrado pela famosa em publicação no Instagram para falar sobre dificuldades de se ter um relacionamento inter-racial, já que ela é branca e ele, negro.

Texto de Maria Flor sobre namoro com Jonathan Haagensen

Maria Flor publicou um texto no Instagram com foto antiga dela e Jonathan, possivelmente da época em que namoravam.

O registro e o texto escrito pela atriz foram divulgados justamente no final de semana em que milhares de pessoas foram às ruas em defesa da causa " Vidas negras importam". O movimento se consolidou após um jovem ter sido assassinado por um segurança do supermercado Extra, na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro. Pedro Gonzaga era negro e foi imobilizado e morto pelo agente de segurança; a atitude foi vista como racista.

Na publicação, Maria Flor narrou uma abordagem que policiais, agentes públicos da segurança, fizeram a ela e ao então namorado Jonathan, ao chegar no Vidigal, no Rio de Janeiro, lugar em que o ator morava e ainda mora. A reação da atriz, na época, foi de "peitar" o policial, e é com base nessa atitude que ela discorre sobre como a diferença de cor da pele entre os dois era um elemento que não poderia ter sido ignorado na relação.

Para ela, os dois terem "ignorado" as especificidades desse tipo de relação dentro de uma sociedade estruturalmente racista pode ter prejudicado a convivência amorosa entre eles.

"A gente se conheceu em um filme e se apaixonou. Isso não tinha nada a ver com a nossa cor. E lá atrás, eu com 19 e ele com 20 anos, a gente não pensou sobre isso. Mas estava lá, o tempo todo estava lá", reforçou.

Em resposta à publicação, Jonathan publicou uma sequência de emojis, de coração e punho fechado, dando apoio ao post.

A visão de Maria, sendo branca, nos ajuda a perceber outro ponto: falar sobre racismo e sobre a inferiorização social a que o negro é submetido não é, de forma alguma, ser racista. Afinal, é apenas reconhecendo um problema, tão enraizado em nossa cultura como o racismo, que conseguimos combatê-lo. E, se ele é uma visão de mundo dos brancos sobre os negros, os brancos também devem fazer parte do assunto.

Relato de Maria Flor

"Eu lembro de um dia que fomos parados na entrada do Vidigal por policiais. Jonathan disse que era morador, mas os policiais mandaram ele descer do carro e começaram a revistá-lo. Aquilo era humilhante. Eu na minha jovem arrogância desci do carro e gritei com o policial. E perguntei indignada o que ele estava fazendo. O Jonathan pediu para eu parar, mas eu gritei e perdi a mão. E o policial nos levou para a delegacia por desacato. Eu nunca vou esquecer o rosto do Jonathan indo para a delegacia. Tudo que ele tinha passado a vida evitando eu tinha feito acontecer por um capricho meu, por não olhar para tudo a minha volta e perceber que a coisa era muito mais grave. Que abaixar a cabeça tinha sido a realidade dele e eu achei que poderia salvá-lo disso. Eu, branca, garota da zona sul do Rio de Janeiro, achei que podia fazer justiça. Mas não, eu não podia, e eu só fiz ele passar por uma humilhação que eu jamais entenderia. Jamais", escreveu. "E mesmo tendo visto e vivido a experiência de ser olhada nos lugares por estar de mãos dadas com um negro, eu jamais entenderei. E sim, temos que olhar para o lado e perceber que a não existência de um negro na escola do nosso filho não é normal, que não ter um negro no cinema ao nosso lado não é normal, não ter um negro num restaurante não é normal, não ter um negro no ambiente de trabalho não é normal. E não pensamos nisso. Não percebemos nosso próprio descaso diário. E não percebemos o racismo estrutural que existe em nós. Hoje eu acho que nosso namoro terminou pela nossa incapacidade de perceber essa gigante distância social que existe na cor da nossa pele".

Repercussão do post nas redes sociais

Por ter levantado o debate sobre racismo estrutural (ou seja, aquele incutido inclusive em instituições e que fazem um negro dirigindo um carro ter mais chances de ser parado em uma blitz do que um branco), a atriz recebeu milhares de comentários de apoio e agradecimento por ter sido tão "empática" ao dividir a experiência com os seguidores.

Na publicação, muitas pessoas que vivem ou viveram relacionamentos inter-raciais também contaram suas histórias, gerando uma onda de depoimentos.

Por outro lado, esses apontamentos são levantados em várias esferas e diariamente por pessoas negras e nem sempre recebem tanta atenção. Uma seguidora, que se identificou como mulher negra, comentou sobre como a narrativa de Maria Flor é valorizada, enquanto a dela, que vive isso na pele, a faz ser "silenciada e até questionada" (o que também é reflexo do racismo estrutural).

"Ai vem você, uma mulher branca que entende o óbvio ainda é elogiada só por entender o óbvio! Será mesmo que pra esse assunto ser levado mais a sério só através de narrativa branca? Maria Flor, você entende essa minha perspectiva?", escreveu a seguidora.

"Entendo. E acho que você tem razão. Acho muito ruim que eu, uma mulher branca, seja mais ouvida que uma mulher negra. Eu não acho certo. Mas eu não acho que a gente tem que criticar por isso e não acho que seja óbvio entender uma coisa que eu não vivo, que só vivi porque me relacionava com uma pessoa negra. Esse entendimento de experimentar o preconceito é muito diferente. Eu acho muito legítima sua colocação. A minha experiência é só minha experiência. Nada mais e nada menos", respondeu Maria Flor.

A repercussão a respeito do relato de Maria Flor é válida para entendermos que as denúncias do racismo são feitas por ativistas negros e vividas diariamente por pessoas negras no Brasil, infelizmente. É preciso ouvir também esses relatos.

Além disso, pessoas que se identificam como brancas precisam discutir e desmistificar a ideia de que "não há racismo no Brasil", para que, de fato, vidas negras importem.

Veja o post:

Casos que levantaram debate sobre racismo no Brasil

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