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Neurociência quer mudar jeito de assistir aula: “Hoje, atividade cerebral é baixíssima”

Publicado 19 Mai 2017 – 11:00 AM EDT | Atualizado 16 Mar 2018 – 08:44 AM EDT
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O atual modelo de aula expositiva não é o suficiente para fazer os alunos aprenderem. E quem diz isso é, nada mais, nada menos, que os estudos mais complexos realizados pela neurociência. Foi constatado que um estudante em sala de aula apresenta atividade cerebral baixíssima, a mesma que ocorre ao assistir televisão em casa.

Existem diversos ramos da ciência que buscam maneiras de potencializar o aprendizado, que está, de maneira geral, muito abaixo do esperado. Um deles tem como objetivo ajustar o que é ensinado nas escolas ao local onde tudo isso será processado, ou seja, o cérebro.

O professor doutor em morfofisiologia do sistema nervoso da PUC-Campinas e do Instituto Brasileiro de Formação de Educadores de Campinas (IBFE)  Alexandre Rezende é um dos entusiastas da aplicação do conhecimento produzido pela neurologia nas técnicas pedagógicas. “O que eu estudo é a área da biologia que trata de células e tecidos de forma a explicar o funcionamento do sistema nervoso. E posso unir à outra coisa que mais gosto: dar aulas”, explica.

Em entrevista ao Vix, Rezende explicou o que a neuroeducação faz e como ela pode ser empregada dentro da sala de aula.

Alexandre Rezende: como neuroeducação pode melhorar aprendizado

O que estuda a neuroeducação?

É importante mostrar a área de neuroeducação dentro do contexto da relação ciência e sala de aula. Os estudos nasceram na década de 1980, nos EUA, a partir dos trabalhos de Howard Gardner, com a teoria das inteligências múltiplas, e de Daniel Goleman, com a teoria da inteligência. A década seguinte brincamos ter sido a década do cérebro, pois houve muitos avanços nos anos 1990. Depois de 2000, houve o início da aplicação da neurociência dentro da sala de aula.

A neuroeducação é uma grande área composta por três área menores: a neurociência em si, a pedagogia e a psicologia. O foco desta área é olhar com mais cuidado o cérebro do aluno e dar dicas de como estudar e estimular a criação de memórias, e também como estimular o professor a procurar esse caminho.

Você afirma que a atividade cerebral é baixa durante aulas convencionais. Por quê?

Digo isso baseado em um trabalho do Institute of Electrical and Electronics Engineers (IEEE) publicado em 2010, no qual pesquisadores colocaram sensores em alunos e monitoraram sua atividade neurológica. Acompanharam como estava a atenção dos jovens estudando, vendo TV, dormindo, trabalhando... Registraram isso durante sete dias, o dia todo. Constataram alta concentração no trabalho, em atividades, estudando para provas e nas provas em si. A atenção empregada para ver TV é bem baixa e é o mesmo nível apresentado nas aulas.

Por isso é importante ter estratégias para manter atenção do aluno durante a aula. A estrutura tradicional que temos tem culpa nisso. O esquema aluno sentado e professor falando precisa ser revisto. A aula é um elemento muito importante para entendimento do aluno.

E como é o processo de aprendizado em nós?

O aprendizado se dá em três etapas importantes: entender, aprender e fixar, nesta respectiva ordem. Primeiro entender, para depois aprender e então fixar. O aluno entende na sala de aula, e aprende estudando, em trabalhos. A fixação necessariamente ocorre quando dormimos. O período de sono é extremamente importante para ter consolidação de memória, tem que ser sempre pensado. Se o aluno dorme pouco é uma pena, pois o cérebro trabalha menos para fixar. O sono reparador organiza bagunça do dia e consolida o que é importante no cérebro.

O que ocorre no cérebro?

Qualquer evento emocional gera três vias para aprendizado: o comportamental, o autônomo e o hormonal. O comportamental é aquele impulso que ativa os músculos e todo o corpo para o evento. O autônomo é controlado pelo sistema nervoso autônomo, que libera a ação de neurotransmissores e controla o corpo além de nossa vontade. O hormonal consiste na regulação de hormônios, como por exemplo a adrenalina, que faz o coração bater mais rápido, e o cortisol, que permite suportar o estresse e inibe o sistema imunológico.

Veja só este exemplo: sabe o aluno que tem branco na prova? O cortisol é liberado para suportar o estresse, mas atua dentro do cérebro e dificulta a formação de novas memórias, e isso afeta o aluno às vezes.

Essas três vias alimentam o cérebro. Na verdade retroalimentam, retornam emoções que passaram. Quando essa retroalimentação é negativa o resultado é péssimo. Mas nós, professores, temos que buscar a retroalimentação positiva.

Como a emoção ajuda no aprendizado?

Há vários tipos de emoção. É uma ferramenta de aprendizado, qualquer tipo de emoção causa uma marca e promove aprendizado imediato. Emocionar positiva ou negativamente o aluno deixa uma impressão em seu cérebro e faz aprender. O foco deve ser que ele sinta também prazer, que gere ativações no cérebro. Se ele se diverte, ele grava. Se for impacto negativo também marca, mas não é essa a ideia.

A tecnologia pode ajudar nesta nova educação?

Tecnologia é inevitável, não pode ficar fora da sala de aula porque o aluno é tecnológico, ele vive isso 24 horas por dia. O aluno precisa disso e o professor estar atento a estratégias novas, ao uso de animações, vídeos, internet... Se o aluno tem uma curiosidade, se pergunta “como é tal animal?”, eu preciso ver na hora, dar a informação na hora. Professor é um instrumento de organização de informações para o aluno. Tecnologia faz parte e vai necessariamente se fundir com a aula tradicional.

É verdade que a iluminação é fator importante para a qualidade do aprendizado?

A melatonina é um hormônio liberado pela glândula pineal e sensível à luz. Quando está claro, ela não produz. Mas, de noite, ela produz e gera sono. Quando o aluno está na sala com a luz apagada de manhã, este hormônio segue em alta. Quando acende as lâmpadas, ele tende a reagir. Nós professores temos que ter cuidado em não apagar a sala toda, mesmo quando for apresentar slide. O aluno responde à fisiologia dele, sua atenção fica maior com luz e ele é mais eficiente.

Como você aplica isso em suas aulas?

Noto que em uma aula muito teórica, homogênea, a atenção cai. Penso em como criar uma aula que motiva aluno. Fazer que a aula seja interessante e fazer aluno notar que aquilo é aplicável a vida dele, isso gera mais interesse. Os alunos gostam também de estratégias como humor ou música. Se divertem e aprendem. Os dados que temos mostram que quando se emociona positivamente, a aprendizagem é mais eficiente. E a neurociência pode ajudar com isso.

Tento fazer contraste. Oscilar o tom de voz chama atenção de aluno, assim como movimentos inesperados, que alertam alunos cujos estímulos são mais visuais. É um pacote de estratégias para gerar atenção e curiosidade.

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