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Cientista brasileira investiga o espaço há 20 anos na Nasa: conheça suas descobertas

Publicado 1 Mar 2017 – 10:00 AM EST | Atualizado 14 Mar 2018 – 09:19 AM EDT
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A astrofísica brasileira Duília Fernandes de Mello, de 53 anos, que esteve presente na edição 2017 da Campus Party, em São Paulo, trabalha na Nasa e é reconhecida por descobertas importantes como a supernova 1997-D (explosão que representa o estágio final da evolução de uma estrela) e pela detecção de bolhas azuis, que são estrelas órfãs e sem galáxias.

Em entrevista ao Vix, Duília contou que trabalha no projeto do telescópio Hubble da Nasa e também é professora e vice-reitora da Universidade Católica de Washington (EUA).

Ela ganhou a honra de ser considerada “uma das 10 mulheres que mudam o Brasil”, pela Universidade de Columbia (EUA).

Apesar das credenciais internacionais, Duília conhece bem o universo acadêmico brasileiro. Ela se formou em 1985 em Astronomia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), realizou mestrado no Instituto de Pesquisas Espaciais (INPE) e fez doutorado na USP.

Mesmo viajando por vários países, ela mantém forte contato com cientistas brasileiros. Considera o fato de a Sociedade Astronômica Brasileira contar com cerca de 700 astrônomos um bom sinal, “mas que poderia ser ainda maior”, disse a cientista.

Supernova 1997-D

A descoberta da supernova 1997-D por Duília foi algo inesperado. Ela estava no Observatório Interamericano Cerro Tololo, no Chile, observando imagens captadas pelo telescópio do Observatório Europeu do Sul (ESO), em janeiro de 1997, pouco antes de ela começar a trabalhar na Nasa.

Analisando as estrelas da galáxia NGC1536, ela percebeu que havia uma ‘intrusa’ ali no meio. Foi então que descobriu: aquilo era uma supernova, uma estrela em seu estágio final. “Ela tinha explodido há 53 milhões de anos-luz”, disse a brasileira.

“Fui simplesmente guiada pela minha curiosidade. Num campo com um conjunto de estrelas, vi que tinha uma a mais. Usei um instrumento em cima dessa estrela e percebi que ela tinha acabado de explodir por conta das propriedades da composição química”, relembrou.

Depois disso, a equipe mandou um telegrama para a União Astronômica Internacional (IAU), que detalha: “A 1997D é uma supernova peculiar, com 100 dias de formação no máximo. Seu espectro contém uma variedade de linhas sobrepostas em vermelho”.

Imagens do Hemisfério Sul

Logo depois disso, em meados de 1997, Duília entrou para a Nasa e começou a cursar pós-doutorado no projeto do telescópio Hubble.

Foi com o telescópio Hubble que o diretor Bob Williams revelou pela primeira vez o campo profundo: trecho considerado ‘vazio’ do espaço que, na verdade, continha mais de 3 mil galáxias.

O resultado foi uma das imagens mais impressionantes do século passado: após fixar a câmera por dezenas de horas em direção ao hemisfério norte, o Hubble captou milhares de corpos celestes há 3,5 bilhões de anos.

Animado com a importante descoberta, Williams decidiu que era hora de apontar o Hubble para outra extremidade, o hemisfério sul, em busca de novas imagens do espaço.

Quando soube do projeto, Duília viu a oportunidade de participar. “Mandei um e-mail para o Williams e falei: ‘por ser brasileira, ou seja, única representante do hemisfério sul aqui na Nasa, queria muito participar desse projeto’. Ele só respondeu: ‘Bem-vinda’”.

Para essa observação, as câmeras do telescópio foram potencializadas, e os cientistas puderam observar galáxias a uma distância de 12 bilhões de anos-luz. “As cores do hemisfério sul são diferentes, porque revelam propriedades diferentes”, explicou Duília. Foi a partir dessa análise que os cientistas encontraram a existência de um quasar, ou seja, um objeto quase estelar que emite 1.000 vezes mais luz que uma galáxia inteira.

Descoberta das bolhas azuis

Quando descobriu a existência de estrelas órfãs (bolhas azuis), em 2008, Duília já tinha uma trajetória notável. Em 1999, foi para o Observatório Espacial Onsala, na Suécia, onde se casou com um astrônomo.

Ficou por lá até 2002, até receber convite da Nasa para trabalhar com imagens ultravioleta extraídas por três telescópios (incluindo o Hubble) de campos ultraprofundos, o GOODS (sigla em inglês de Grande Observatório de Origens de Pesquisas Profundas).

“Naquele tempo, a área captada pelo telescópio aumentou bastante e já começava a se falar da existência de 15 mil galáxias”, contou Duília. (Hoje o Hubble já estima a existência de mais de 100 bilhões delas.)

As análises do GOODS permitiram fazer estatísticas de supernovas e explosões de estrelas, ajudando a provar a teoria de que o universo está constantemente em expansão.

A experiência de Duília de Mello com observações de imagens ultravioletas foi importante para desvendar os “aglomerados azuis brilhantes de estrelas”, ou seja, as bolhas azuis. Para isso, ela contou com a colaboração de Claudia Mendes de Oliveira, do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo (USP).

“Há regiões pequenininhas na cauda de galáxias em colisão que geram um efeito-maré, em que a gravidade faz com que a galáxia fique meio distorcida”, explica Duília. “Nessa distorção de gás, vê-se um orfanato de estrelas jovens. Elas são as bolhas azuis”.

Isso mostra que essas estrelas estão no meio do nada – ao contrário do que muitos astrônomos acreditavam antes, que as estrelas se formavam apenas em nuvens densas de materiais dentro das galáxias.

Por isso, quando a descoberta foi revelada, em 2008, a brasileira enfatizou: “Elas são estranhas, mas podem ajudar a descobrir como se formam galáxias”.

Sonhos e conquistas

Apesar de toda sua trajetória de descobertas, Duília ainda tem muitos planos pela frente e faz questão de incentivar as mulheres que sonham em ser cientista, como ela sonhou um dia.

“A mulher não faz ciência igual ao homem, assim como a mulher não é igual ao homem”, refletiu Duília, lembrando que até hoje sua área de atuação é predominantemente masculina.

“Costumo dizer: ‘siga o seu sonho, mas tenha o talento para isso’”, aconselha Duília. “A ciência é exclusivista, ela vai selecionar o profissional bom. Quem não é bom não vai nem terminar o curso”.

“As mulheres acham soluções pra certas coisas de um jeito diferente. Então você imagina quantos talentos desperdiçados existem hoje na humanidade se não deixamos a menininha sonhar em ser cientista”, concluiu.

Ciência e saúde

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