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Brasileiros da USP descobrem dois novos planetas: o que já se sabe sobre eles?

Publicado 4 Nov 2016 – 05:02 PM EDT | Atualizado 20 Mar 2018 – 12:57 PM EDT
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É fato que a Ciência tem provado com frequência que o Universo é cheio de espaços ainda inexplorados. Mas, a descoberta da vez pode ser ainda mais surpreendente:  em uma distância de 300 anos-luz da Terra, existe uma estrela bem similar ao Sol e dois planetas que a orbitam, um super-Netuno e uma super-Terra. E, o mais inacreditável é que eles podem, de fato, nos ensinar muito sobre como funciona o nosso sistema solar.

Esta foi a descoberta de uma equipe internacional cientistas liderada por um professor da Universidade de São Paulo (USP). Os pesquisadores reconheceram uma super-Terra e um super-Netuno ao redor da estrela gêmea do Sol, a HIP 68468, após 43 noites de observação, realizadas entre 2012 e 2016. O sistema está localizado na direção da constelação de Centaurus.

O Vix conversou com o astrônomo Jorge Melendez, responsável pela pesquisa e professor do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da USP (IAG-USP), para entender como foi possível identificar a estrela, os dois planetas e outros aspectos intrigantes, como o fato de a estrela ter devorado um planeta com seis vezes mais massa do que a Terra.

Ficou curioso para saber como estas novidades implicam no que se sabe sobre a Terra e o sistema solar? Leia a seguir.

Novos planetas descobertos por cientistas

A super-Terra e o super-Netuno foram encontrados em órbitas muito próximas à estrela mãe, a HIP 68468. A percepção só foi possível no Observatório La Silla, na periferia do deserto do Atacama (foto acima), no Chile.

A descoberta foi publicada na edição de outubro de 2016 da revista Astronomy & Astrophysics e é cheia de detalhes curiosos em comparação à Terra e ao sistema solar, como nos explicou o professor Jorge Melendez.

Para começar, o sistema todo tem 6 bilhões de anos, ou seja, é mais velho que nosso sistema solar, de 4,6 bilhões de anos, aproximadamente. 

Outras diferenças peculiares são a proximidade dos planetas com sua estrela mãe e a massa de cada um deles comparada a Terra e a Netuno. Veja as características detalhadas de cada um.

Super-Netuno

O super-Netuno, por exemplo, tem o dobro de massa do Netuno “oficial”. No entanto, enquanto Netuno orbita o Sol a 30 vezes a distância Terra-Sol, o super-Netuno orbita a sua estrela a apenas 0,7 vezes a distância Terra-Sol. 

Segundo os pesquisadores, isso indica que o super-Netuno não se formou tão perto da sua estrela, mas deve ter migrado de uma região externa para a zona interna do sistema planetário. 

Super-Terra 

A super-Terra é ainda mais próxima à estrela HIP 68468: orbita a apenas 0,03 vezes a distância que existe entre a Terra “oficial” e o Sol. Isto significa que ela tem órbita 10 vezes menor que a de Mercúrio, o planeta mais interno do Sistema Solar. 

Ela também é mais pesadinha que nosso planeta; conforme apurado pelos cientistas, deve ter 3 vezes a massa terrestre. 

Apesar da descoberta, o professor Melendez pondera que a equipe continuará investigando a classificação  deste planeta. “Há 98% de chances de o planeta ser real. Mas, a gente precisa mais de observação para dizer que realmente é um planeta”. A análise se dá, basicamente, por meio do sinal gravitacional do planeta – que, neste caso, “é muito fraco”, explica o professor.

Como são identificados os planetas

O astrônomo explicou ao Vix como, de fato, os cientistas chegaram à conclusão de que existem estes dois exoplanetas, isto é, planetas que orbitam uma estrela que não seja o Sol. 
Eles não observam diretamente o planeta, mas, sim, o efeito gravitacional naquele campo.

“Devido à lei da gravidade universal, sabemos que, quando o planeta orbita em torno da estrela, também faz uma força na estrela, puxando-a um pouco”, destaca. “Em uma órbita muito pequena, bem menor que a do nosso planeta, é possível detectar com precisão os movimentos”.

Planeta devorado pela estrela

A pesquisa mostrou que a que a gêmea solar HIP 68468 também já devorou outra super-Terra, seis vezes mais ‘massuda’ que a Terra. Isto porque ela apresenta excesso do elemento lítio, intensamente presente nas formações rochosas dos planetas. Acima, está a representação de um planeta sendo engolido por sua estrela.

“Por essa estrela ser mais velha que o Sol, ela deveria naturalmente apresentar menor quantidade de lítio”, explica Melendez. “Como ela tem mais lítio que o Sol, ele deve ter vindo de outro planeta”.

Para entender melhor, é importante saber que planetas preservam o lítio, pois suas temperaturas não são altas o suficiente para destruir esse elemento. Por isso, se um planeta é engolido por sua estrela, pode causar um aumento significativo do lítio na atmosfera da estrela.

O que isso tem a ver com a gente?

Apesar de ser fascinante, muita gente pode se perguntar o que a descoberta de exoplanetas tão distantes pode representar para o entendimento de como funciona o sistema solar. 

Fato é que os cientistas traçaram um comparativo interessante entre os sistemas que coloca Júpiter (foto abaixo), o maior planeta do nosso sistema, como um “organizador da arquitetura planetária”.

Acompanhe o raciocínio do professor Melendez:

“Os astrônomos estão tentando responder nos últimos anos por que não se formam super-Terras no sistema solar. Uma explicação que surgiu no ano passado foi a de que Júpiter tem um papel importante para manter a configuração do sistema solar, que não deixa que Netuno, por exemplo, migre para a região interna. Se isso acontecesse, a órbita de Vênus, Marte, Mercúrio e da própria Terra orbitas ficariam caóticas e os planetas ficariam instáveis”, detalha.

O que os pesquisadores puderam perceber desse novo sistema planetário é que no há nenhum Júpiter mantendo a ordem gravitacional. “Sabemos disso com certeza, porque seria fácil achar o sinal gravitacional de um planeta desse tipo, porque o sinal gravitacional seria forte”, comenta.

“Este fato reforça ainda mais a pesquisa teórica que mencionei; Júpiter é importante para a arquitetura planetária por estar na região externa do sistema solar e servir como barreira para os outros planetas”.

Avanços da pesquisa e mais detalhes

A equipe pretende continuar a observação de 63 estrelas gêmeas solares, onde há sinais de que existem outros planetas. Para isso, entretanto, precisa usar a tecnologia do Observatório Europeu do Sul (ESO), no deserto da Atacama, que poderia detectar planetas gêmeos da Terra.

“Mas, isso vai depender do Brasil aprovar a adesão ao Observatório Europeu do Sul (ESO). O acordo está pendente desde 2010 e ainda não foi assinado”, explica o professor.

Equipe

A equipe de cientistas ainda é composta por Sylvio Ferraz-Mello, Jhon Yana-Galarza, Leonardo dos Santos, Lorenzo Spina (USP), Marcelo Tucci Maia (Laboratório Nacional de Astrofísica), Alan Alves-Brito (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), Megan Bedell, Jacob Bean (University of Chicago), Ivan Ramirez (Universidade de Texas em Austin), Martin Asplund, Luca Casagrande (Universidade Nacional Australiana), Stefan Dreizler (Universidade de Göttingen), Hong-Liang Yan, Jian-Rong Shi (Academia Chinesa de Ciências), Karin Lind (Max Planck Instituto de Astronomia) e TalaWanda Monroe (Instituto de Ciência do Telescópio Espacial).

Planetas e suas peculiaridades

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