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Como o Zika age no organismo de pessoas saudáveis, grávidas, como afeta urina e até o sêmen

Publicado 3 Ago 2016 – 06:45 PM EDT | Atualizado 14 Mar 2018 – 09:30 AM EDT
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Assim como outros vírus, quando em contato com a corrente sanguínea, o Zika atinge várias partes do corpo. Quando isso acontece, o organismo tenta combate-lo e, durante esse processo, sintomas da doença - como febre, manchas na pele, coceira, dores musculares e nas articulações - podem ou não aparecer (em alguns casos o vírus é assintomático, não dando indícios no paciente de que ele está presente no corpo). Para entender bem a ação do Zika, é preciso saber que o vírus não tem o mesmo tipo de efeito em todo mundo.

Em pessoas saudáveis, o Zika é “derrotado”, da mesma forma que outros vírus, como o da gripe. Ele é combatido pelo sistema imunológico e não costuma causar complicações mais sérias. Contudo, em gestantes e em pessoas com doenças que afetam a imunidade, ele pode ser bastante perigoso e até causar complicações irreversíveis.

Por onde o Zika passa quando entra no corpo?

Primeiro contato: corrente sanguínea

A epidemiologista e infectologista Helena Andrade Brígido, membro da Sociedade Brasileira de Infectologia,  explica que após a contaminação, o vírus circula por toda a corrente sanguínea e tem uma evolução aguda. A princípio, e dependendo de quem for a vítima, essa é vista como uma doença “benigna”, já que os pacientes costumam ficar bem em torno de 10 dias e o próprio organismo é o responsável por eliminar o vírus do sangue, o que pode demorar de 5 a 7 dias.

Saliva também pode apresentar o vírus

A partir do momento em que o vírus está no organismo, ele pode ir para todas as outras partes do corpo, já que ele é capaz de atingir todos os tecidos vivos. Por isso já se encontrou, também, indícios de Zika na saliva. Contudo, são poucos estudos sobre o tema, ainda não há a confirmação de que um beijo possa transmitir, por exemplo. Também não se sabe por quanto tempo o vírus permanece na saliva.

Urina também é “contaminada”

Na urina, de acordo com especialistas, o vírus costuma ficar presente por duas semanas, mas a também infectologista Lígia Brígido, do laboratório Delboni Medicina Diagnóstica, comenta que estudos já encontraram Zika Vírus na urina após três semanas do aparecimento dos sintomas, o que poderia indicar que esse número de dias da permanência do vírus no xixi seria ainda mais do que acreditam atualmente os estudiosos.

Zika no sêmen

Nos homens, é possível que a infecção pelo vírus chegue ao esperma, e é por isso que existem riscos de transmissão de Zika Vírus através do sexo. No sêmen, o Zika pode permanecer ainda mais tempo, permitindo que o homem ainda possa transmitir a doença mesmo depois de vários dias sem sintomas. “Já houve caso em que foi encontrado vírus no sêmen 62 dias após o aparecimento dos sintomas, por isso, a orientação é que homens com o vírus não tenham relações sexuais sem proteção por 8 semanas após o aparecimento dos sintomas”, explica a Lígia.

Como o zika age no organismo das mulheres grávidas

Em novembro de 2015, o Ministério da Saúde confirmou a relação entre o zika e a microcefalia em bebês. O vírus pode afetar bebês em todas as fases da gestação, mas os danos costumam ser mais graves quando a infecção ocorre nos três primeiros meses de gestação, que é quando o sistema nervoso central do bebê está em desenvolvimento.

Inflamação na placenta

Em testes feitos no primeiro semestre de 2016, pesquisadores encontraram partículas do vírus em células de Hofbauer, que são as responsáveis por fazer a defesa do bebê e ajudam na manutenção da placenta.

“O que ocorre é uma inflamação da placenta – vilosite – que quebra a barreira placentária e possibilita que o vírus entre em contato com estas células de Hofbauer. Estas células, que podem se movimentar dentro da placenta, poderiam se aproximar dos vasos do feto e transmitir o vírus”, diz a médica patologista e uma das autoras do estudo em parceria com a Fiocruz Lúcia de Noronha da PUC-PR (Pontifícia Universidade Católica do Paraná).

A vilosite também é conhecida como plancetite. Trata-se de uma inflamação na vilosidade (estruturas microscópicas) da placenta que tem a função de filtrar o sangue da mãe que passa para o bebê.

Como chega até o feto?

De acordo com a patologista, a hipótese mais provável é que o vírus parasite nas células de Houfbauer, que são células móveis responsáveis pela proteção do bebê, e a usam como uma espécie de “Cavalo de Troia” (lenda mitológica que conta que um cavalo foi usado de esconderijo para guerreiros gregos invadirem o território inimigo)  para conseguir chegar à corrente sanguínea do feto.

De acordo com o estudo, além da confirmação de que o vírus passa de mãe para filho por meio da placenta, também foi descoberto que o órgão é alvo preferencial do vírus, no caso das gestantes, e que ela pode ser atingida em qualquer fase da gestação.

“Foram analisados tecidos de outros órgãos, incluindo rins, pulmão e baço. A maioria deles não apresentou lesões causadas pelo vírus e, os que apresentaram, tratavam-se de lesões secundárias”, explica a chefe do Laboratório de Virologia Molecular da Fiocruz Paraná, Cláudia Nunes Duarte dos Santos, que também participou do estudo.

Anomalias no sistema nervoso

A placenta pode ser atingida em qualquer fase da gestação e o momento em que ela é afetada pode definir o tipo de problema que o bebê poderá apresentar. As malformações do cérebro (microcefalia) ocorrem com mais frequência quando o bebê é atingido pelo Zika nos três primeiros meses de gestação, porque é quando o feto está em formação e ainda não desenvolveu totalmente o órgão. Contudo, Lúcia afirma que já existem casos de lesões e danos cerebrais causadas até mesmo com o zika atingindo o feto aos seis e sete meses de gestação.

Outras alterações no feto

Apesar de a microcefalia ser o problema mais comum entre os causados pelo Zika nos bebês, ele não é o único. Por isso, o correto é dizer que os bebês que passam por esse problema na barriga da mãe sofrem de Síndrome Congênita Associada à Infecção por Zika Vírus Neonatal.

“Já foram observadas relações entre problemas oculares em bebês e a infecção por zika vírus. Ainda é cedo para dizer quais problemas a infecção causa porque vai depender da gravidade de cada caso e como o vírus age em cada organismo, por isso, precisamos acompanhar os bebês que nascem com alterações”, diz Lígia Pierrotti.

Por isso, o fato de o bebê não ter microcefalia não significa que ele é totalmente saudável e não foi afetado pelo vírus, porque o Zika pode causar alterações neurológicas que só poderão ser diagnosticadas após o nascimento.

“Em decorrência do vírus, o bebê pode nascer cego, surdo, com atraso neurológico, malformações esqueléticas e musculares e não ter a microcefalia. Por isso que o diagnóstico completo só pode ser feito conforme o desenvolvimento da criança”, explica Helene Brígido.

Mortes de fetos

Existem muitos casos de mortes de fetos em decorrência do vírus. Contudo, ainda não existem dados de quantos abortos aconteceram em decorrência do Zika. “Quando há morte, pode ser que isso tenha acontecido porque a mãe contraiu uma maior quantidade de vírus ou por causa de alguma falha no sistema imunológico dela”, diz a epidemiologista Helena.

Pode ser que o bebê não tenha nenhum problema de saúde?

“Evidenciamos que o vírus chega à placenta em qualquer fase da gestação. Investigamos o caso de uma gestante que teve diagnóstico confirmado no terceiro trimestre de gravidez. Neste caso, ela deu à luz a um bebê saudável, apesar de termos identificado a presença do vírus nas amostras da placenta”, detalha a virologista Claudia sobre o estudo.

Não existem evidências de doenças em bebês de mães que foram infectadas pelo zika antes da gestação. Além disso, assim como muitas pessoas têm zika e nem sequer sentem os sintomas, os bebês também podem ser acometidos pela doença sem que o vírus cause qualquer tipo de dano a saúde dele. Ou seja, nem todos os bebês que sofrem com o Zika terão microcefalia ou algum outro problema de desenvolvimento.

Como o zika age em casos mais graves

Assim como acontecem nos bebês, a tendência é que o vírus agrida o sistema nervoso, o que pode ser perigoso para pessoas com doenças autoimunes ou de base, como o lúpus, ou com câncer, porque esses pacientes costumam ter baixa imunidade, ficando mais expostos aos efeitos nocivos do Zika.

“As mortes que tivemos no Brasil até agora foram de pessoas que tinham algum problema em relação a imunidade, porque o vírus atua de forma mais agressiva. Em pessoas saudáveis, ele não gera grandes complicações”, explica Helena.

As alterações no sistema nervoso comprometem praticamente todas as funções do corpo, podendo surgir inflamações em nervos, músculos e a pessoa pode ter dificuldade para andar.

Além disso, já existem casos de uveite, inflamação em uma camada intermediária do olho que pode levar à cegueira. Contudo, essas complicações em decorrência do zika são muito raras.

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