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Denúncias de estupro caem, mas número de vítimas por dia ainda é ASSUSTADOR

Publicado 4 Nov 2016 – 03:00 PM EDT | Atualizado 20 Mar 2018 – 12:57 PM EDT
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Anualmente, o Fórum de Segurança Pública lança o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, uma análise dos números e características dos crimes cometidos no país. Entre eles está o estupro.

No ano de 2015, de acordo com o documento, o número de registros de estupros caiu quase 10% em relação ao ano anterior. Em 2014 foram 50.438 notificações, uma média de quase seis estupros por hora, contra 45.460 registrados em 2015, ou 125 vítimas por dia - a imensa maioria são meninas e mulheres.

Número de estupros em 2015: realidade

Se fossem esses os números absolutos, por si só já causariam desespero. A realidade, no entanto, é ainda mais grave. De acordo com os próprios analistas, é difícil produzir dados precisos sobre a violência doméstica e sexual porque são os crimes mais subnotificados do mundo.

Ou seja, a maioria das vítimas não notifica às autoridades, fator que faz com que o número oficial seja sempre muito inferior ao número real de casos.

Para tentar chegar a um número mais próximo da realidade, as instituições que analisam o cenário levam em consideração dois parâmetros. O primeiro surgiu a partir de um estudo internacional, o “National Crime Victimization Survey”, que aponta que apenas 35% das vítimas prestam queixas. Nessas condições, o Brasil em 2015 teve, em média, 129,9 mil casos.

O outro parâmetro foi criado a partir de uma pesquisa brasileira sobre o tipo de crime aqui. Os resultados obtidos com o estudo “Estupro no Brasil: uma radiografia segundo os dados da Saúde” mostram que apenas 10% dos casos são registrados. Neste cenário, podemos supor que tivemos 454,6 mil estupros no ano de 2015. Em média, 1.245 estupros por dia ou 52 por hora. O que pode significar quase uma mulher estuprada por minuto no Brasil.

O próprio documento levanta as principais causas para o número de registros ser muito menor do que o de casos efetivamente. “Os números são ainda mais alarmantes se levarmos em conta a subnotificação. Assim como a culpabilização das vítimas de estupro, respostas negativas das autoridades e as descrenças aos relatos de abuso afetam a decisão das vítimas em denunciar”, esclarece.

Por que as mulheres não denunciam o estupro?

Culpabilização, resposta negativa das autoridades e descrença

Para a defensora pública Ana Rita Souza Prata, coordenadora do Núcleo Especializado de Promoção e Defesa dos Direitos da Mulher da Defensoria Pública de São Paulo, de fato um dos grandes problemas a ser superado no acolhimento das vítimas de abuso e estupro é a forma como ela é atendida. “Adolescente ou adulta a sua moral é sempre colocada em xeque e a sua verdade é contestada a depender da forma como ela se porta ou se coloca naquele momento, se é digna ou não de confiança”, comenta a defensora sobre a culpabilização da vítima.

Como resultado deste atendimento julgador, temos, além do reforço da ideia equivocada de que o comportamento de uma mulher interfere no seu merecimento ou não de respeito, um afastamento das mulheres do Sistema Judiciário que mostra que onde elas deveriam ser protegidas, na verdade podem ser julgadas e descreditadas.

“Infelizmente é como se a mulher precisasse provar que não era merecedora daquela violência em vez do homem provar que não cometeu o crime. Fica parecendo que, a depender das características do caso, de alguma forma o crime seja justificável”, acrescenta a promotora de justiça Gabriela Mansur, coordenadora do Núcleo de Combate à Violência Doméstica do Ministério Público de São Paulo.

De acordo com a promotora, a grave consequência disso, que gera na mulher receio e medo de procurar auxílio na justiça, é o alto índice de feminicídio. “Se não mudarmos o comportamento da justiça, vamos continuar afastando essas mulheres e vamos cada vez mais perder vítimas”, alerta.

O que é estupro?

Outro empecilho para que os números de registros se tornem reais, é a ideia de que o estupro só acontece em uma rua escura e praticado por um desconhecido. Pesquisas mostram que 25% dos crimes são cometidos por familiares ou conhecidos e 59% acontece dentro de casa. Embora seja difícil de reconhecer, o estuprador pode ser o pai, o namorado, o marido, o irmão, o primo ou o vizinho.

Essas características comuns aos crimes – o estuprador ser conhecido e o caso ter acontecido dentro do ambiente familiar – tornam as denúncias ainda mais difíceis, seja pelo desafio de a mulher se reconhecer vítima, seja pela pressão ou descrédito familiar.

Diminuir casos e melhorar registros

Para os profissionais que atuam nesta área, o caminho para superarmos o problema é investir em políticas públicas. Educação contra a cultura do estupro desde a infância, campanhas de conscientização, sensibilização e treinamento dos funcionários que atendem as vítimas, grupos de estudos e trabalho e a criação de delegacias e núcleos de atendimento acessíveis e efetivos, como as delegacias da mulher, estão entre as medidas.

Delegacia da mulher x registros de casos

Em números absolutos, São Paulo é o Estado com o maior número de registros – o que não significa, no entanto, que é estado onde os crimes mais acontecem, já que o número de subnotificação é grande. Em contrapartida, é importante considerar também que é o estado com o maior número de Delegacias da Mulher. São 132 unidades, seguido por Minas Gerais, com 61. Um questionamento válido é: será a ampliação das delegacias especializadas nesses casos é uma alternativa para deixar mulheres mais seguras para efetivar as denúncias?

Violência contra a mulher

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