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Proibir protestos políticos nas Olimpíadas 2016: medida fere a constituição?

Publicado 9 Ago 2016 – 06:42 PM EDT | Atualizado 20 Mar 2018 – 12:57 PM EDT
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Alguém grita “Fora Temer” nas arquibancadas do Sambódromo do Rio de Janeiro, onde está acontecendo a competição de tiro com arco, durante os Jogos Olímpicos 2016. A Força Nacional aparece e tira o homem que momentos antes tinha sido impedido de mostrar um cartaz com os mesmos dizeres e que acredita ser o responsável pela manifestação.

“Um agente chegou a dar voz de prisão, mas questionamos qual era a alegação. Dois deles tentaram levar meu marido à força, pegando pelos braços e pelas pernas. Então, ele decidiu acompanhar os agentes numa boa. Queriam me levar como testemunha, mas estavam meus filhos e disse que não ia. No final, só meu marido foi”, a mulher do homem contou ao El País.

Em Belo Horizonte, em Minas Gerais, um grupo que estava vestido com letras nas camisetas que formavam a mesma frase ("Fora Temer") foram abordados durante partida de futebol feminino entre EUA e França.

“Os seguranças vieram e falaram que não poderíamos ficar. E não queríamos brigar, estávamos acompanhados de muitas senhoras e até uma criança de 8 anos. Entregamos os cartazes primeiro, e depois a polícia veio nos retirar. Embaralhamos as letras, para continuar dentro do Mineirão, mas não aceitaram. Nos retiraram mesmo assim”, disse Eduardo Ferreira, um dos integrantes do grupo, em entrevista ao portal de notícias do UOL.

A medida foi ordenada pelo Comitê Rio 2016, que alegou que atos políticos ou religiosos estavam proibidos durante as Olimpíadas, de acordo com a  Lei 13.284, sancionada em maio de 2016 pela presidente Dilma Rousseff. O texto diz que as condições para acessar e permanecer nos locais oficiais dos jogos são:

Não portar cartazes, bandeiras, símbolos ou outros sinais com mensagens ofensivas, de caráter racista ou xenófobo ou que estimulem outras formas de discriminação; não entoar xingamentos ou cânticos discriminatórios, racistas ou xenófobos; e não utilizar bandeiras para outros fins que não o da manifestação festiva e amigável.

Enquanto isso, o parágrafo seguinte traz outra cláusula:

“É ressalvado o direito constitucional ao livre exercício de manifestação e à plena liberdade de expressão em defesa da dignidade da pessoa humana”, também garantido pela Constituição brasileira, que diz que “é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independemente de censura ou licença”.

Hugo Antonio Vieira, advogado formado pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), explica que a repressão e a proibição da manifestão é ilegal. “A liberdade de expressão visa à livre manifestação de opinião a fim de garantir a plena liberdade do indivíduo. Por óbvio, não é um direito absoluto, esbarrando em certos limites como a proibição de discursos xenófobos, racistas. Contudo, censurar as opiniões políticas, quando a livre manifestação é garantida constitucionalmente, inclusive para criticar a atual gestão governamental, remonta tempos de ditadura, na qual outra justificativa foi construída. Permitir a censura no evento olímpico seria não apenas violar a constituição, mas também ignorar todo o retrospecto histórico”, diz ele.

“A opinião política não gera ofensa. Ela incomoda e no protesto esse é exatamente o objetivo. Mas incomodar não significa que deve ser proibido. Compare com uma greve, por exemplo. Ela incomoda demais, mas também é permitida na constituição seu livre exercício, mas constantemente é atacada. A liberdade de expressão sempre é questionada quando ataca as bases na qual a elite se fundamenta”, completa o advogado.

Entretanto, o posicionamento da organização é diferente: “Respeitamos a democracia, mas acreditamenos que dentro da instalação não é o momento”, declarou o Comitê Rio 2016 para a assessoria de comunicação do jornal El País.

Em meio às discussões sobre o tema, o juiz federal do Rio de Janeiro, João Araújo liberou uma liminar provisória na noite do dia 8 de agosto, em resposta a um pedido do Ministério Público Federal, que acredita que a lei sancionada fere a Constituição. Ele liberou as manifestações políticas de forma pacífica durante os Jogos Olímpicos e proibiu a repressão e a retirada de manifestantes dos locais oficiais.

Araújo ainda determinou que as entidades envolvidas sejam multadas em R$ 10 mil por cada manifestação reprimida, em descumprimento da medida. A decisão ainda pode ser revogada mediante recurso e pode ainda ser analisado pelo STF (Supremo Tribunal Federal).

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