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Ela viveu dois extremos, da bulimia ao fitness, até descobrir seu equilíbrio: ser ela mesma

Publicado 18 Jul 2017 – 12:51 PM EDT | Atualizado 15 Mar 2018 – 04:09 PM EDT
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Faz poucos meses que a jornalista Mirian Bottan, do interior de São Paulo, decidiu abrir seu Instagram para escrever textos sobre autoestima, aceitação do corpo e bem-estar mental e físico.

O crescimento de seguidores é impressionante e isso se deve à identificação que milhares de mulheres têm com um problema que, infelizmente, é cada vez mais comum: a destruição da própria saúde em nome do corpo "perfeito".

No caso de Mirian, essa obsessão a fez passar por dois extremos: a bulimia e a ortorexia (vício em comidas saudáveis e exercícios físicos). “Muita gente tem distúrbios alimentares ‘travestidos’ de vida saudável”, diz.

Ao relatar algumas lembranças que marcaram sua relação com o corpo, Mirian parece contar também histórias de outras tantas mulheres, que, como ela, começaram a sentir a pressão para ter um corpo padrão ainda meninas.

Obsessão com o corpo na infância

“Durante muitos anos da minha vida, dos 5 aos 12, participei de concursos de beleza em cidades do interior. Até então, minha família não achava que aquilo poderia afetar o meu emocional. Mas só depois de muita terapia é que consegui perceber que os desfiles foram um gatilho para o início das minhas compulsões seguidas de vômitos, um ano depois do meu último concurso”, conta Mirian.

Um transtorno alimentar geralmente acontece por uma série de fatores. No caso da jornalista, influenciou muito o fato de ela ter crescido assistindo às mulheres de sua família odiar os próprios corpos e lutar contra a balança. “Quando engordei 2 kg, pela fase normal de adolescência e mudança do corpo, fiquei desesperada."

E foi assim que a balança que a mãe usava para se pesar virou a ferramenta-chave para o início de sua compulsão, aos 13 anos. “Me pesava de manhã, de tarde e à noite. Comecei a achar que meu braço estava gordo, repetia a mesma coisa que as minhas tias, mulheres da minha família”, conta.

Depois de ler uma matéria sobre bulimia, em uma revista, ela teve ideia de começar a expurgar o que comia no vômito, para emagrecer. “Eu achava que era forte, que não iria ficar doente por vomitar algumas vezes”, diz ela, que conviveu com a doença por 16 anos.

A bulimia nervosa consiste em constantes e dolorosos episódios de compulsão alimentar, em que é consumida uma quantidade excessiva de comida, em um pequeno período de tempo, com a nítida sensação de perda de controle.

Quem sofre com essa doença tenta compensar o possível ganho de peso com medidas extremas para expurgar o alimento, como exercício físico excessivo, jejuns prolongados, vômitos, abuso de diuréticos, laxantes e anorexígenos. É um transtorno alimentar comum principalmente em mulheres.

Compulsão por comida, álcool e compras

“Dos 16 aos 26, passei por momentos que muitas mulheres vivem a vida inteira: tinha compulsão alimentar para preencher vazios emocionais, usava de laxantes, vômitos e dietas restritivas para tentar chegar a um padrão de corpo. Fazer restrição na alimentação, qualquer uma, é muito perigoso e eu sei disso na pele”.

Depois de alguns tratamentos que não deram certo, as coisas começaram a mudar quando Mirian passou um ano desempregada e expandiu sua compulsão para outras áreas, como o álcool e compras, além da comida.

“Foi muito difícil. Eu passava o dia comendo, vomitando e bebendo”, diz. E, em um desses episódios, acordou passando muito mal e teve a certeza de que a doença, que até então não conseguira tratar, poderia acabar com sua vida. “Marquei terapeuta para o dia seguinte e foi quando conheci meu psicanalista, que me acompanha até hoje”.

Da bulimia à neura fitness

Dois meses depois de iniciar a psicanálise, a jornalista já estava trabalhando e começou a se reerguer. Ela também buscou ajuda de uma nutricionista para começar a se alimentar corretamente e, assim, conheceu a "vida fitness".

“Em 4 meses, comecei a notar diferença no meu corpo e, com reeducação alimentar, eu voltei a comer de uma maneira mais saudável. Antes, eu tinha medo da comida do dia a dia. E, pela primeira vez, um profissional estava me orientando sobre o que fazer depois de ter episódios de vômito. Eu me sentia amparada”, comenta.

As compulsões tornaram-se cada vez mais espaçadas. “Um dia, dois dias, e de repente eu me dava conta de que fazia quatro dias que eu não vomitava.”

Foi também aos poucos que a preocupação em se manter fitness foi tomando conta da vida de Mirian de uma maneira muito negativa. “Um ano depois, eu tinha ganhado 5 kg de músculo e estava com apenas 14% de gordura corporal. Eu também ia religiosamente para a academia”, diz.

Finalmente, ela havia conquistado o corpo padrão que perseguiu a vida inteira. Mas isso não a trouxe felicidade. "Não conseguia comer uma pizza em paz com meu namorado ou minha família. Sempre que eu saía da dieta, tinha compulsão. Treinava religiosamente, mas, se faltava na academia e comia um brigadeiro, também saía do eixo. Não havia um equilíbrio”, conta.

“Fui percebendo isso aos poucos, que a minha insegurança não tinha mudado. Um certo dia, li algo sobre ortorexia - obsessão por vida saudável, algo pouco discutido por aqui - e comecei a entender que eu estava com aquilo", relata. Para Mirian, trata-se da antiga neura com o corpo, "embalado" de vida saudável.

Equilíbrio está na cabeça

“O problema do mundo fitness é que, da forma como é colocado para as pessoas, com tanta obsessão, a saúde mental fica em risco. As redes sociais estão repletas de mensagens perigosas para ‘seguir a dieta’, como cuspir o brigadeiro ou ficar pelada na frente do espelho e comer um hambúrguer”, diz.

Mesmo com a barriga chapada e cheia de ‘gominhos’, a jovem percebeu que não queria mais levar a sua tão desejada vida fitness e regrada em frente. Em uma viagem com o namorado, sua obsessão por comida saudável e a insegurança que sentia acabaram com o passeio dos dois.

“Quando você coloca todo o foco no seu corpo, a coisa mais importante que você tem, então, será o corpo. E isso é muito pouco, vai gerar comparação e frustração. Naquela época, eu não conseguia enxergar o que ele via em mim”, comenta.

Depois disso, Mirian decidiu pegar firme no trabalho psicológico com o terapeuta. “Comecei a procurar conteúdos sobre autocompaixão e fui desencanando da questão do corpo, de ter meu foco 100% nisso e continuar infeliz como sempre. Foi uma mudança natural. Passei a aceitar a gordura do meu corpo, a me alimentar bem e a não restringir nenhum ingrediente. Hoje, eu como o que eu quiser, e isso me fez parar de ter compulsão alimentar e, claro, de vomitar também.”

Já faz quase 1 ano que Mirian não tem recaídas dos vômitos e compulsões alimentares. O tratamento com psicanalista continua. “Hoje, estou muito distante da vida que eu levei um dia. Não tenho a mínima vontade de ter compulsão. Mudei meu relacionamento com a comida. A proibição tem um rebote físico e psicológico, que a gente acha que conseguirá vencer, mas é uma ilusão.”

As quase 200 mil pessoas que acompanham atualmente as fotos incríveis de Mirian nas redes sociais podem ver alguém que é feliz com o próprio corpo, mas, acima de tudo, procura ser real. “Agora, eu vejo meu corpo de outra maneira, não tenho mais como não gostar dele, é outra relação. Talvez a única coisa que eu ainda esteja trabalhando a aceitação é dos meus seios, mas eu chego lá”, conta.

Como aumentar o amor próprio: 3 dicas de Mirian

  • “Não maltrate o seu corpo com restrições alimentares. Isso não é saudável para a sua saúde fisiológica ou mental”
  • “Quando olho para os meus seios e penso que gostaria de mudá-los, começo lembrar que não quero correr o risco de uma cirurgia, nem gastar o dinheiro com ela. Então, tento fazer um exercício mental de aceitação, quase que diário”
  • “Uma coisa que me ajudou muito a achar o meu corpo lindo foi comprar lingerie para esse corpo que eu tenho agora. E não tentar moldar o meu corpo para uma lingerie bonita. Quando fiz isso, me achei incrível e hoje adoro comprar calcinha e sutiã”

Ter autoestima 

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