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Internet, cérebro e o universo: teoria afirma que suas redes funcionam da mesma forma

Publicado 22 Mar 2018 – 06:00 AM EDT | Atualizado 20 Mar 2018 – 12:57 PM EDT
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Há mais mistérios entre o nosso cérebro e o universo que supõe a nossa vã ciência lógico-matemática. Mas, talvez, estejamos mais próximos de encontrar um padrão para ambos do que poderíamos imaginar. Em seu mais prestigioso artigo, o físico Dmitri Krioukov, hoje professor titular da Universidade Northeastern, nos Estados Unidos, demonstrou a existência de padrões comuns aos tipos de redes conhecidas pelo homem e afirmou: as redes neurais, a internet, as estradas e o próprio universo têm conexões que seguem as mesmas leis.

Que conexões são essas que regem o universo?

No artigo Network Cosmology, publicado na revista científica Nature, o pesquisador descreveu em linguagem matemática o comportamento de aceleração de tais conexões e redes. “As semelhanças estruturais e dinâmicas de diferentes redes reais sugerem que algumas leis universais podem descrever com precisão a dinâmica dessas redes, embora a natureza e a origem comum de tais leis permaneçam difíceis”, afirmou no texto.

O trabalho desenvolvido por Krioukov e pela equipe da Associação Cooperativa para Análise de Dados da Internet, da Universidade da Califórnia, não se propõe a afirmar quais são e nem sequer como funcionam tais leis e padrões que regem a rede cosmológica que une todo o tempo-espaço do universo.

A argumentação se baseia principalmente em aplicações matemáticas que identificam e padronizam comportamentos. Para chegar a essa conclusão, supercomputadores processaram informações complexas sobre o universo e projetaram uma estrutura em larga escala em um formato gráfico. As propriedades deste gráfico mostram alta semelhança com outras redes complexas.

“As semelhanças estão em certas propriedades estruturais básicas dos gráficos que representam essas redes. Na verdade, existem duas dessas propriedades: distribuição de graus e agrupamento (no qual três nós de rede são conectados por três links)”, explica o físico em entrevista ao VIX. “E decorre de outros trabalhos nossos que muitas propriedades estruturais desses gráficos são semelhantes”, argumenta.

Aplicação da descoberta

Para Gastão Lima Neto, professor e pesquisador de astronomia do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da USP, o artigo é elogiável por limitar sua descoberta estritamente à representação matemática. “O estudo não conclui nada, só mostra que as redes são semelhantes. É prudente e de bom senso. Mas não é algo que se possa tirar grandes conclusões por enquanto”, pondera.

Por outro lado, os cientistas envolvidos no trabalho acreditam que este é um primeiro passo. “Isto pode levar à descoberta de leis fundamentais, a partir das leis da gravidade, com as equações de Einstein na relatividade geral, e da dinâmica de redes complexas do universo, cujas equações ainda são desconhecidas”, disse em comunidade Marián Boguñá, da Universidade de Barcelona, que trabalhou no projeto.

Base teórica da análise do universo

O estudo de redes, em linhas gerais, trabalha com dois principais modelos teóricos de abordagem de redes (que têm diversas subdivisões entre si). São eles, a teoria das redes complexas e a teoria das redes causais.

Em ambos, há dois conceitos fundamentais para quantificar o comportamento das redes: o usuário (seu perfil no Facebook como emissor de informações) e o nó (como uma cidade que conecta e liga diferentes estradas).

Em redes de comportamento conhecido (pelo menos parcialmente), identifica-se de cara os usuários e nós. Troncos viários na malha rodoviária, perfis e páginas em redes de relacionamento, neurônios na estrutura cerebral. Para a cosmologia, contudo, não faria sentido usar de estrelas, planetas ou galáxias para padronizar o comportamento da rede.

A abordagem de Krioukov toma o tempo-espaço como o nó desta rede. Exatamente isso: o tempo-espaço. “Trata-se de uma entidade quântica quadridimensional que junta a dimensão do tempo e mais as três dimensões do espaço”, explica o Prof. Gastão Neto. É como se cada “unidade” de tempo-espaço fosse um pixel no filme da história do universo.

E, para quantificar a abordagem matemática, o autor introduziu os primeiros tempo-espaço, perto da explosão do Big Bang, e aproximou a um futuro distante. Desse modo, pode elaborar a rota de seu comportamento em rede.

Tamanho observável do universo

É verdade que o universo pode ser infinito e eterno, mas a equipe de físicos e matemáticos chegou ao número mínimo de “pixels” de tempo-espaço - e a partir deste montante produziram a aproximação matemática.

O número é um incrível 10 elevado a 250, o que significa o número 1 seguido de 250 zeros. Em termos de comparação, o número de moléculas de água em todos os oceanos da Terra é estimado em 4,4 x 10 (elevado a 46).

O gigantesco número foi reduzido de modo a preservar as propriedades vitais da estrutura de rede do universo graças ao supercomputador chamado Trestles. O relatório de trabalho dos pesquisadores mostra que foi possível, assim, processar informações que inicialmente estavam previstas para até quatro anos em pouco mais de um dia.

Que respostas isso traz para os mistérios do universo?

"De modo algum afirmamos que o universo é um cérebro global ou um computador", disse Krioukov à época da publicação, em 2012. De lá para cá, o paper foi citado em 90 trabalhos acadêmicos, mas até agora sem que nenhum resultado expressivo em relação a novidades sobre o funcionamento do universo.

A grande conquista, acredita o autor e a equipe envolvida no trabalho, é a perspectiva de projetar o comportamento futuro do universo com precisão, a partir de padrões já conhecidos e funcionais em outras redes.

Nas ciências da comunicação e tecnologia, é possível prever que um vídeo será viral em seus primeiros minutos no ar na internet; no funcionamento do cérebro, conseguimos saber até com anos de antecedência o roteiro da morte de neurônios provocados pela doença de Alzheimer. Claro que sempre há margem de erro, mas o caminho está mais pavimentado.

No universo, as incertezas são maiores. A quantidade de variáveis é imprecisa e seu comportamento, idem. “Em sistemas complexos com equações não lineares implicam em situações caóticas”, explica Gastão Neto.

Um exemplo deste tipo de equação é a previsão do tempo. Ou mesmo a frequência dos batimentos cardíacos. Até mesmo o comportamento das ações na bolsa de valores. “A busca é entender o que está por trás dessas situações caóticas e pode ter, realmente, algo fundamental nessas redes para que se chegue a tal resultado. O porquê, ninguém sabe”, conclui.

Em entrevista, o autor do paper garante que tais similaridades estão longe de serem aproximações metodológicas ou mesmo coincidência. “A probabilidade de tal coincidência é extremamente baixa. As coincidências em física são extremamente raras e quase nunca acontecem. Há sempre uma explicação, que pode não ser imediatamente óbvia”, afirmou Krioukov.

Cosmologia, cérebro e a internet têm as redes em comum, mas ainda estamos longe de saber que tipo de mecanismo as faz similares. Fica a dica: a próxima vez que observar um nó em meio a um emaranhado de uma rede, saiba que ele pode conter o segredo do universo.

Cérebro e universo

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