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O que há na lua de Saturno para torná-la o local mais propício à vida fora da Terra?

Publicado 17 Abr 2017 – 03:55 PM EDT | Atualizado 16 Mar 2018 – 10:26 AM EDT
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“É o mais perto que já estivemos até hoje de identificar um ambiente com condições necessárias para vida”. Foi dessa forma que Thomas Zurbuchen, diretor associado da Nasa, anunciou a descoberta feita pela sonda Cassini em Enceladus, a sexta maior lua que orbita Saturno

O satélite tem características específicas que o tornam propício ao surgimento da vida como conhecemos na Terra. Inclusive, é possível que, há bilhões de anos, ela tenha aparecido aqui da mesma maneira que se anuncia em Enceladus.

Por que Enceladus é tão propícia à vida?

Embora seja um dos maiores satélites de Saturno, a Enceladus é pequena em relação à nossa Lua: tem diâmetro equatorial de 504 km², já a Lua apresenta 3475 km².

Toda sua extensão é coberta por uma camada de gelo de 40 km de espessura, e abaixo desta crosta há um oceano sub-glacial de água salgada.

Energia interna que esquenta oceano

O que torna o satélite especial é sua fonte de energia interna. Sob uma grossa camada de gelo, a Enceladus, tal qual outras luas de Saturno e Júpiter, é um corpo que suporta grande quantidade de energia.

A causa deste fenômeno é a força de maré, ou seja, a imensa pressão gravitacional que os enormes planetas fazem sobre seus satélites.

“Conforme orbitam em torno de planetas tão grandes, as luas sofrem o efeito da gravidade e se deformam. Este processo, que chamamos força de maré, gera atrito no núcleo da lua, que aquece e cria fontes hidrotermais, derretendo a camada mais interna dos oceanos”, explica Douglas Galante, pesquisador do departamento de astrobiologia do IAG da USP.

“Além da força gravitacional que pode provocar atividade vulcânica no leito dos oceanos, há a pressão do gelo em si, que é também fonte de energia”, completa Roberto Costa, do Instituto de Astronomia, Astrofísica e Ciências Atmosféricas da USP.

É possível que outras luas de Júpiter e Saturno tenham aspectos semelhantes - o satélite Io, inclusive, tem vulcões que podem ser observados desde o espaço - mas foi na Enceladus que se identificou a condição perfeita na qual a água aquecida libera o hidrogênio molecular de forma abundante.

“O hidrogênio molecular, na proporção encontrada, é capaz de prover energia química. Encontrar essas moléculas significa que há fonte de energia para o surgimento dos micróbios, que são capazes de tirar energia delas para sobreviver. Ocorre de forma semelhante a qual as plantas fazem com a fotossíntese, mas sem necessidade do Sol”, explica Douglas. O processo é chamado de quimiossíntese.

Oceano líquido e hidrogênio em abundância

No pólo sul do satélite, a sonda Cassini, enviada pela Nasa em missão a Saturno em 2004, encontrou fissuras por onde saem jatos de partículas de gelo, água em formato líquido e vapor até quilômetros de distância.

A descoberta de um oceano em si não é a novidade - há anos já se sabe da presença de água em satélites de Saturno e Júpiter, como a gigante Europa. “Não é incomum haver presença de água nesses satélites e ela é, inclusive, muito rica em composição química”, explica o professor Roberto.

A singularidade está na presença detectada de dois dos três ingredientes primordiais para a existência da vida como conhecemos: água em formato líquido e uma fonte de energia para o metabolismo. “O próximo passo é encontrar moléculas orgânicas [o terceiro elemento fundamental]”, explica Douglas.

Para que haja moléculas orgânicas, é preciso detectar a presença de ingredientes químicos específicos, caso do carbono (mais importante), hidrogênio, nitrogênio, oxigênio, fósforo e enxofre. A quantidade de hidrogênio encontrada em Enceladus é tão alta, que permitiria o surgimento de vida como conhecemos a partir desses elementos.

Não foram encontrados todos eles na água de Enceladus. Para isso, segundo Douglas, seria necessário que a sonda pousasse na lua.

“Não detectamos vida, mas vimos sua comida. Nós encontramos uma fonte de alimento para isso”, afirmou Hunter Waite, autor do estudo publicado também na revista Science. “É como se fosse uma loja de doces para micróbios”.

É preciso entender que esta é uma analogia dos cientistas: não é, de fato, a comida de tais organismos, mas a fonte de energia para seu surgimento.

Origem da vida na Terra e em Enceladus: semelhanças

A vida da forma como conhecemos na Terra, de acordo com a tese mais aceita na comunidade científica, começou em condições muito semelhantes a da Enceladus. Entende-se que a forma mais primitiva de vida em nosso planeta teve origem com micróbios próximos às fontes termais oceânicas.

“Estima-se que a vida começou na Terra há 3,8 bilhões de anos, sendo que a vida macroscópica tem aproximadamente 800 milhões de anos. Isto é, foram 3 bilhões de anos apenas de vida microscópica”, relata o professor Roberto. Significa que se algum nível de vida já esteja em desenvolvimento por lá, estamos longe de considerá-la uma vizinhança espacial.

E o que determina o nascimento desta primeira forma de vida em um planeta ou satélite? “É a pergunta que vale um Nobel. Ainda não temos esta resposta na ciência, mas estamos nos aproximando”, conclui o pesquisador de astrobiologia.


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Vida fora da Terra

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