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Os verdadeiros pais adotivos

Publicado 30 Jun 2016 – 08:15 PM EDT | Atualizado 2 Abr 2018 – 01:02 PM EDT
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O que são pais adotivos? O que são pais verdadeiros? Usa-se a expressão "pais verdadeiros" quando se faz referência aos pais genitores. No entanto, há um grande engano, todos os que se colocam na posição de pai e mãe podem se considerar pais verdadeiros, pois quando não são genitores são pais legais. Por outro lado, se a criança cresce escutando que não tem pais verdadeiros como pode ela ser uma criança verdadeira?

Há pais genitores que não são verdadeiros, quando ao longo da gestação e após o nascimento, não desejam conhecer e/ou reconhecer a criança e, sendo assim, não adotam a sua própria cria. Há pais genitores que "criam" filhos que crescem com sentimento de abandono. Quantas crianças vivem desamparadas nas suas próprias famílias de origem?

O que de errado pode ter em ser adotado? Quais as fantasias que a criança não irá fazer da sua família de origem? Como construirá esta mesma criança a sua própria família?


Desejo neste artigo abordar algumas questões que atravessam a vida da maioria dos pais adotivos. Esses se sentem muitas vezes ameaçados na suas verdadeira função de pais: há com freqüência dúvidas se devem ou não contar a criança sobre a adoção. Junto com essa pergunta vem o medo de que, se a criança souber a verdade, poderá renunciá-los como pais, ou ainda tornarem-se crianças e adultos problemáticos em função da sua história de vida.

É preciso pensar que a criança entende muito mais do que se possa imaginar sobre as coisas que estão a sua volta e principalmente que fazem referência a ela. Quando as palavras são usadas pelos adultos com o objetivo de que a criança passe a compreender o sentido das coisas ou compreender a situação a qual está inserida, será maior a possibilidade de trilhar um caminho tranqüilo no que diz respeito ao seu desenvolvimento emocional. É preciso dizer à criança que ela é a filha adotiva dos seus pais adotivos.

Há sempre um saber sobre o que não se sabe. Ainda que se tente "preservar" (não sei se esse é o melhor termo a ser usado aqui, pois não vejo no silêncio um ato de preservação) o segredo quanto à adoção, sempre vai haver algo que escapa na relação da criança com os seus pais.

Sendo assim o desmentido, isto é, o que no seu significado traz implícito um reconhecimento seguido de uma recusa a saber poderá deixar marcas sujeitas há dores no futuro da criança.

Desta forma, quais as inferências que pode fazer uma criança que por algum lugar sabe da sua adoção, mas não pode falar do assunto? O que de errado pode ter em ser adotado? Quais as fantasias que a criança não irá fazer da sua família de origem? Como construirá esta mesma criança a sua própria família?

Ao falar para a criança sobre a forma como chegou àquela família é importante marcar a existência de pais que a geraram e que, por não poderem criá-la, deixaram aos cuidados de pais adotivos. Dessa forma os pais genitores ganham um corpo pelo discurso desses pais adotivos. As crianças que os reconhece pelo discurso dos pais adotivos com freqüência não sentem necessidade de conhecê-los de fato.

É Importante que possa aparecer no discurso desses pais uma dose de gratidão pelos pais genitores por terem colocado a criança no mundo, pois desta forma a criança pode construir uma identidade em bases positivas. Uma criança que pode escutar gratidão e até mesmo certa valorização dos pais adotivos por seus genitores pode inferir, por exemplo, que: "se meus pais genitores foram bons porque proporcionaram felicidade aos meus pais adotivos porque me criam, eu também sou boa".

Uma outra preocupação dos pais é de que os filhos adotivos sintam-se diferentes. Todas as crianças são diferentes umas das outras e podem viver vários conflitos na infância. O fato é que se há conflito, seja na criança adotada ou na criança criada por seus genitores, é porque algo não foi introjetado de forma tranqüila.

Crianças adotadas que se sentem rejeitadas na escola, por exemplo, agem da mesma forma que crianças criadas por seus genitores que também se sentem rejeitadas. O que está em jogo aqui é o conflito familiar que foi instaurado independentemente do modo que esta família foi constituída. É importante avaliar ainda se de fato essa rejeição é sentida pela criança ou se é uma fantasia ou pré-conceito dos próprios pais adotivos.

Homens e mulheres que desejam adotar precisam estar cientes da responsabilidade que terão diante da criança. Não se trata apenas da responsabilidade quanto à forma de criar (cuidados com o corpo, carinho, educação). Todo filho tem direito a conhecer a sua história e não poderia ser diferente com o filho adotivo. A criança precisa conhecer sobre si mesma! Pior do que uma historia que a princípio possa parecer triste é não ter uma história ou ainda uma falsa história.

Ainda que o máximo de informação que se possa dar ao filho adotivo, em função da pouca informação que se tem sobre os pais genitores, é o fato de ter sido deixado numa instituição para ser recebido por pais que pudessem de fato recebê-la e amá-la, ele tem esse direito!

Mônica Donetto Guedes é psicanalista.

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