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O ato de cuidar

Publicado 30 Jun 2016 – 08:14 PM EDT | Atualizado 20 Mar 2018 – 12:57 PM EDT
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É importante pensar a criação dos filhos não objetivando apenas o desenvolvimento de crianças saudáveis, mas também de adultos saudáveis. Portanto, é preciso olhar para a criança de forma a perceber que o que se constrói a partir desta relação inicial será preponderante para o desenvolvimento futuro. O que proponho é que se passe de um olhar fragmentado, de onde as ações muitas vezes estão submetidas àquela fase a qual a criança está remetida, a olhá-la de forma integrada, pensando o que daquela ação pode trazer como conseqüência, benefícios ou prejuízos. Neste artigo, convido você a refletir sobre a importância da relação mãe e bebê nos primeiros meses de vida.

O bebê de 0 a 6 meses de idade apresenta uma dependência absoluta, pois ainda não tem noção de suas necessidades e precisa de outras pessoas que possam interpretá-las e atende-las. É só a partir da experiência com essa mãe que o bebê pode reconhecer e viver as suas primeiras experiências com o próprio corpo. A mãe precisa dar a contenção e a regulação necessária para que o bebê possa se constituir. O acolhimento inicial, a capacidade da mãe de traduzir o que, a princípio, aparece como intraduzível é fundamental para o desenvolvimento da criança nesta fase primitiva.

É através desses cuidados diários que a mãe estará contribuindo para o desenvolvimento do EU do seu filho


O bebê, no início da vida, só pode se ver no olhar da mãe ou de quem cuida dele. É o amor e a forma como dirigem seu olhar para o bebê que permitirá que ele se constitua como um sujeito independente dela. Nesta fase, a mãe ou seu substituto precisa dar conta de três funções essenciais para o desenvolvimento do bebê.

A primeira delas é a de dar sustentação e amparo a ele, o que se torna possível oferecendo-o um colo acolhedor e seguro. É importante ainda que seja oferecido um ambiente que se mantenha dentro de um padrão, sem que haja muitas mudanças em sua rotina, para que assim o bebê mantenha baixo o seu nível de ansiedade. Se tudo que envolve os seus órgãos sensoriais estiver sendo manejado com sensibilidade, essa função de sustentação e amparo estará sendo exercida com suficiência. Essa função, portanto, tem como objetivo fazer com que o bebê internalize uma sensação de confiança e se sustente emocionalmente neste ambiente que o cerca.

A segunda função estaria relacionada à importância na manipulação do bebê. A troca de fraldas, o banho, como é colocado para dormir no colo e como é alimentado, por exemplo, traz uma carga de afeto que contribuem para o seu bem-estar. Pode ainda fazer suas primeiras experiências com o corpo ao mesmo tempo em que o desenvolve. É através desses cuidados diários que a mãe estará contribuindo para o desenvolvimento do EU do seu filho. É importante ressaltar que não basta que os cuidados tenham apenas um caráter objetivo, quer dizer, deixá-lo limpo, sem fome e quieto. Não! A forma como esses encontros entre mãe e bebê são produzidos é que imprimem nele as marcas necessárias ao seu desenvolvimento. O afeto que permeia esse encontro será primordial nesse processo.

O que de fato dará ao bebê condição de, aos poucos, ir tomando consciência do seu corpo são essas impressões de afeto que a mãe deixa nele. A terceira função da mãe está relacionada à apresentação dos objetos. Por exemplo: quando a mãe oferece o seio, no momento em que o bebê o imagina, dará a ele certa onipotência, uma sensação de que pode controlar o ambiente. Esta experiência o tira da possibilidade de viver um sentimento de angústia insuportável.

Podemos perceber que essas três funções acontecem simultaneamente, assim, por exemplo, quando uma criança está sendo amamentada, está sendo ao mesmo tempo acalentada e segura. Como já foi dito essas três funções são importantes no processo de maturação do bebê, mas cabe aqui uma pergunta: o que pode acontecer caso a mãe não exerça essas funções adequadamente?

Não se pode dar certezas quanto aos acontecimentos porque o desenvolvimento do sujeito é complexo, mas cabe aqui levantarmos uma hipótese: uma mãe que não foi "suficientemente boa" poderá promover como conseqüência o surgimento de um bebê cheio de angústias, o que pode levá-lo a desenvolver um quadro patológico.

Quero ressaltar aqui a possibilidade do bebê desenvolver uma personalidade construída num falso self (falso eu). E como isto se daria? O bebê, ao se desiludir por não ter as suas necessidades satisfeitas pela mãe ou substituta, acaba por se adaptar aos cuidados que ela pode lhe oferecer (ainda que insuficiente) e passa a desenvolver uma personalidade pronta a adaptar-se ao que o meio oferece desconsiderando as suas tendências, gerando sentimentos de irrealidade e vazio.

Penso ser fundamental que todos os que estão envolvidos na educação, formação e ensino de bebês e crianças tenham conhecimento de que as suas ações são determinantes no seu desenvolvimento físico e psíquico de todas elas.

Monica Donetto Guedes é psicanalista, psicopedagoga e pedagoga do Apprendere Espaço Psicopedagógico

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