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Não tenho leite

Publicado 30 Jun 2016 – 05:42 PM EDT | Atualizado 20 Mar 2018 – 12:57 PM EDT
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Os benefícios que a amamentação oferece, para a criança e para a mulher são, de fato, muitos: maior contato entre mãe e filho, fortalecendo o vínculo emocional e o desenvolvimento do sistema nervoso, há o aumento da imunidade, além de o leite materno ser considerado a nutrição completa para o recém-nascido. Amamentar também ajuda a mãe a emagrecer, devido à recuperação do tamanho do útero, e a se prevenir contra o câncer de mama. Em função disso, diversas campanhas estimulam o aleitamento exclusivo, algumas até resultando em projetos de lei que ampliam a licença-maternidade, aumentando o período de amamentação das mães empregadas. Mas, e quando não há leite suficiente para alimentar o bebê? O problema gera ansiedade e frustração em muitas mães, que se acham incapazes de viver a maternidade plenamente.

Muitas mães, desesperadas com a falta de lactação, recorrem a outros tipos de leite e líquidos para complementar a nutrição. "A gente fica muito frustrada. Todos os livros e revistas especializadas só falam dos benefícios do leite materno. Mas e quem tenta, tenta e não consegue proporcionar isso ao seu filho, como fica?", questiona a administradora Bianca Goie, 28 anos. Ela passou a dar leite em pó no primeiro mês de vida do filho, que não conseguia mamar exclusivamente no peito: "Não tinha leite. Tentei várias coisas, tomei chás, remédio para estimular (o hormônio) prolactina, comi alfafa, e nada adiantou. Cheguei até a ir a um banco de leite, recebi ótimas orientações, mas eu não conseguia produzir a quantidade que o bebê necessitava", conta.

Causas de ordem psicológica e emocional, agitação, cansaço, falta de apoio do pai e da família e um ambiente não-propício dificultam a amamentação


Cunhada de Bianca, Carine Assis, 33 anos, também teve que complementar a alimentação do filho com leite artificial. Seu bebê nasceu prematuro, aos sete meses de gravidez, e, por isso, a amamentação foi ainda mais complicada: "Ele precisava muito e eu não conseguia dar conta. Ficamos 45 dias no hospital e em alguns momentos eu chorava por não ter leite. Lá mesmo, o Pedro já teve que começar a tomar outro tipo de leite, através de sonda", afirma Carine. "Acho que ele ter nascido prematuro e o fato de eu ter retornado ao trabalho contribuíram para prejudicar a amamentação. Não tive direito à licença-maternidade porque trabalhava sem carteira assinada, e logo a rotina de estresse voltou. Esse foi um dos motivos para eu ter desistido de tentar dar o meu leite. E isso também me fez sentir culpada", relata.

Estresse inimigo da amamentação

A presidente da Sociedade de Ginecologia e Obstetrícia do Rio de Janeiro, Vera Fonseca, afirma que não há nenhum problema físico que impeça a produção do leite na mulher. Ela concorda que um dos principais fatores que podem comprometer a lactação é o estresse: "Causas de ordem psicológica e emocional, agitação, cansaço, falta de apoio do pai e da família e um ambiente não-propício dificultam a amamentação", explica Vera, que menciona ainda a sucção de forma inadequada e o consumo de bebidas alcoólicas como outros fatores agravantes. A respeito do uso de remédios à base de hormônios, Vera desaconselha: "Quase não dá resultado. O que ajuda na produção do leite é tomar muito líquido e continuar a dar o peito. A sucção da mama pelo bebê é o maior estimulante da prolactina, hormônio responsável pela secreção láctea", recomenda.

A pediatra Isa Yoshikawa sustenta a idéia de que o seio produz conforme a demanda. "Quanto mais oferecemos, mais leite produzimos", garante. Isa trabalha no Banco de Leite Humano (BLH) do Instituto Fernandes Figueira (IFF), no Rio de Janeiro. O BLH é um centro especializado no apoio à mulher lactante, que, além de coletar, pasteurizar e distribuir leite humano para crianças em unidades neonatais, conta com uma equipe de profissionais que orientam mães com dificuldades na amamentação. "Temos um serviço por telefone, mas recomendamos o atendimento pessoalmente. Tiramos dúvidas, procuramos avaliar a forma como a mãe cuida dos seios e a maneira que dá de mamar, e ajudamos a melhorar essa prática", destaca a pediatra. De acordo com as estatísticas da Fiocruz, no ano passado, quase um milhão de pessoas foram atendidas nos 187 Bancos de Leite espalhados pelo Brasil.

Segundo Isa, as maiores queixas das mulheres que procuram o BLH têm a ver com feridas nos mamilos. Ela é contra a utilização de mamadeiras e chupetas, pois prejudicam o aleitamento: "O mecanismo de sucção na mamadeira e na chupeta é diferente e mais fácil do que o que acontece no bico do peito. O bebê se acostuma ao que é mais fácil e, quando tenta no peito, acaba demorando mais a sugar, o que pode, além de causar feridas, fazer com que a mãe pense que há pouco leite", explica. Ela diz que, mesmo se for necessário complementar a alimentação da criança com outro leite, o ideal é que este seja dado em colher ou copinho.

Outro problema comum é a mastite: "O leite pode vir todo de uma vez enquanto o bebê precisa de pequenas quantidades. Se a mulher não esvaziar o peito, o acúmulo e a pressão podem fazer o leite empedrar, ocasionando uma mastite", adverte Isa. A psicóloga Carolina Duarte, 31 anos, já foi mãe duas vezes e sofreu deste problema: "Doía muito. É muito importante a ordenha para retirar o excesso de leite que fica nos seios. O leite ordenhado pode ser guardado, inclusive, para alimentar o bebê em outra hora", aconselha Carolina, que faz parte do grupo Amigas do Peito. Ela, assim como Isa, se opõe às mamadeiras e chupetas: "A chupeta traz inúmeros malefícios. Atrapalha a amamentação, interfere na dentição, e é uma espécie de ‘cala-boca' para a criança", alerta.

Amigas do peito

A ONG Amigas do Peito foi criada há 27 anos com o propósito de reunir mães e pais para trocarem experiências sobre a amamentação. As voluntárias do grupo respondem a perguntas através do site ( www.amigasdopeito.org.br) e realizam reuniões mensais abertas àqueles que quiserem falar sobre o assunto. Carolina, uma das coordenadoras da equipe, acredita que não existe falta de leite e que todas as mães podem produzi-lo e amamentar seus filhos: "Já presenciei o caso de uma moça que veio a uma reunião nossa e dizia que seu leite havia secado. Depois de muita conversa, choro e desabafo, tentamos tirar leite de sua mama e levamos um susto quando ele esguichou", cita. "Acho que o estresse afeta muito. O ideal é que a mãe esteja tranqüila, relaxada. Assim, o leite sai naturalmente", diz Carolina.

Com paciência, calma e persistência, a mulher tem tudo para amamentar seu filho por vários meses - e até doar para bancos de leite. Relaxar, beber muito líquido, evitar álcool e procurar orientação e informação é essencial nesta fase. E cuidado com os seios também, é claro. "Se as mães tentarem da forma correta, fazendo o bebê abocanhar toda a auréola (parte escura) do peito, não há preocupação: o leite vai surgir", assegura a ginecologista Vera Fonseca.

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